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São Paulo, quarta-feira, 23 de abril de 2003

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CARLOS HEITOR CONY

Garrote vil

RIO DE JANEIRO - Estranham que a esquerda nacional -e a de outros países- não tenha desancado o regime de Fidel Castro, que pisou na bola, real e inutilmente. No poder há 42 anos, vencendo obstáculos dramáticos e de forma heróica, ele poderia dispensar manifestações de força, justificáveis na eclosão de um processo revolucionário, mas desumanas após tantas décadas de "revolução vitoriosa".
Cuba é hoje um fato consumado em termos históricos. Foi o único país do hemisfério que implantou o comunismo com tudo de bom e de mau que o regime produz e sustenta. A falta de liberdade é, sem dúvida, a sua principal mácula, e algumas de suas prioridades podem e devem ser discutidas e condenadas.
A educação básica, a saúde de primeiro combate, a conscientização de uma soberania -tão rara na América Latina- são pontos favoráveis ao regime de Fidel Castro. Ele próprio mudou com o tempo e com o poder, tornou-se um dos maiores protagonistas do século 20, recebeu o papa com dignidade, aceitou conversar com Carter, tem absoluta razão quando se queixa do estúpido boicote que sofre há anos do "mundo livre", liderado pelos Estados Unidos.
Por tudo isso, não se justifica esse passo atrás na direção errada, mandando fuzilar adversários. Lembro um episódio dos últimos anos do ditador Franco, na Espanha. Um dissidente foi condenado ao garrote vil. Uma onda de protestos tomou conta do mundo -o papa, a ONU, a maioria do prêmios Nobel, todos pediam misericórdia ao ditador.
Franco, embora católico praticante, chegando mesmo a ser carola, respondeu ao papa: "É uma questão de princípio". E mandou executar o dissidente.
É uma pena que Fidel tenha imitado, à sua maneira, o ditador espanhol. A Revolução Cubana, como fato histórico, merece estar acima da figura de seu chefe. O novo lema que deve ser criado é: "Cuba, sim; terror de Estado, não".


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