São Paulo, quinta-feira, 23 de maio de 2002

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DEMANDA LEGÍTIMA

O Banco Central (BC) decidiu manter a taxa de juros básica inalterada, no elevado nível de 18,5% ao ano, até 19 de junho. Em vista de recentes declarações cautelosas de seus diretores, a decisão do BC não chegou a surpreender. Mas, da ótica da atividade produtiva, ela decepcionou, pois tende a sancionar a piora das expectativas quanto à expansão da economia.
Alguns louvarão a atitude do BC por sinalizar forte compromisso com o cumprimento da meta de inflação. De fato, a inflação oficial acumulada no período de 12 meses findo em abril foi de 8%, bem acima, portanto, da meta oficial, que é de limitá-la a 3,5% em 2002.
Mas essa meta é bastante questionável. Ela foi fixada em 2000, quando se vivia a ilusão de que a transição para o regime de câmbio flutuante reduzira drasticamente a fragilidade macroeconômica do país. Desde então ficou claro o quanto ainda é preciso caminhar para chegar a um crescimento sustentável. Ficou claro, também, que a meta de inflação fixada para 2002 se tornou irrealista.
Como a inflação oficial foi de 7,7% em 2001 e a indexação de preços, em especial de serviços públicos, "transmite" parte dessa alta para 2002, limitar a inflação a 3,5% neste ano quase certamente exigiria sacrificar muito a atividade produtiva. Isso já vinha sendo reconhecido, implicitamente, pelo BC, cujos diretores falavam em limitar a inflação de 2002 à faixa de 4,5% a 5%, mantendo pequena "margem de segurança" ante o limite de 5,5%.
A decisão de ontem revela a preocupação de impedir que essa flexibilização corroa a credibilidade da política de metas de inflação. Um pequeno corte dos juros poderia realmente aumentar um pouco o risco (que ainda parece limitado) de ultrapassar o limite superior da meta.
É certo, no entanto, que o crescimento da economia foi em alguma medida prejudicado pela decisão. Diante disso, haverá quem elogie o BC por ter revelado "impermeabilidade a pressões políticas". Mas não é legítimo que a sociedade exija, além da relativa estabilidade de preços, também um mínimo de dinamismo da economia?
Não que essa demanda deva ser dirigida ao BC: o governo como um todo é o destinatário. O BC e as metas de inflação são apenas peças de um modelo. Um modelo que tem sido eficaz contra a inflação, mas pouco eficaz em prol da produção.



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