São Paulo, segunda-feira, 23 de junho de 2008

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MARINA SILVA

O mundo pós-petróleo

A MUDANÇA de patamar no preço, combinada com a descoberta de novas reservas no Brasil, fez a discussão sobre o uso dos recursos gerados pelo petróleo dar um salto, como mostrou a Folha ontem.
Se a idéia é usar parte deles para financiar políticas públicas, estamos no rumo certo, mas, em se tratando da riqueza vinda do combustível tido como símbolo do aquecimento global, é preciso colocar em questão a lógica do seu uso.
Em primeiro lugar, se não podemos ainda viver sem petróleo, temos que acelerar a saída dessa dependência, com a expansão das energias limpas. Contudo, a grande pergunta é: como utilizar os lucros do petróleo para ajudar a erguer o mundo pós-petróleo?
A resposta transcende a matriz energética e remete à matriz inteira desse futuro. É um exercício de juntar na mesma equação crescimento e qualidade de vida, PIB e justiça social, produção e proteção ambiental. Poucos discordariam de usar a montanha de dinheiro do petróleo para tratar educação, ciência e tecnologia, saúde, meio ambiente da forma merecida e inadiável. Mas seria muito ruim se os recursos fossem fragmentados por pressões circunstanciais ou para a criação de fundos nominais que acabam contingenciados. Ou seja, a questão não é a partilha, mas a qualidade e o sentido da partilha.
Na área do meio ambiente, o debate vem de algum tempo. A lei prevê 10% sobre a receita bruta da produção, cerca de 1 bilhão de reais/ano, para pesquisa sobre fragilidades ambientais das áreas de extração e recuperação de danos causados por acidentes e vazamentos de óleo. Mas isso não funciona bem; apenas pequena parte desse recurso fica de fato disponível.
No debate do Plano Nacional de Mudanças Climáticas, a sugestão do MMA foi alocá-lo em um Fundo Sobre Mudanças do Clima, com 30% para contenção de vazamentos e acidentes e 70% para pesquisa e ações de mitigação e adaptação aos impactos do aquecimento global e redução na emissão de gases.
A criação desse fundo consta do projeto de lei da Política Nacional de Mudança do Clima, no Congresso desde o último dia 5.
Um fundo de maior envergadura, como se depreende da matéria da Folha, será muito bem-vindo, sobretudo se unir as pontas de áreas essenciais para o desenvolvimento sustentável e para planejar o futuro. É justo pensar nisso quando o dinheiro começa a jorrar em maior volume. Não teria cabimento usá-lo apenas para fazer caixa, abrir balcão de demandas ou gerar mais dinheiro, que é bom, todo mundo precisa, mas não deveria ser o principal objetivo de vida de nenhum indivíduo e de nenhuma nação.

contatomarinasilva@uol.com.br


MARINA SILVA escreve às segundas-feiras nesta coluna.


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