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Passo chinês
Recebida com ceticismo, decisão do BC da China de retomar oscilações da moeda sugere mudança paulatina na direção da economia do país
A China anunciou o fim da cotação fixa de sua moeda em relação
ao dólar, que vigorava desde julho
de 2008, quando se agravou a crise financeira global. Antes, o país
mantinha um regime de rigidez,
mas havia margem para variações
controladas.
A novidade não significa que os
chineses adotaram a flutuação
cambial, algo que poderá ocorrer
no futuro como resultado da gradual integração financeira do país
com o resto do mundo.
A partir de agora, a moeda chinesa oscilaria em relação a uma
cesta de moedas, mas dentro de limites estreitos, determinados pelas autoridades. Como é comum
na China, um véu de mistério encobre a decisão: não se sabe que
moedas farão parte da cesta nem
como a taxa poderá variar.
O Banco Central chinês deixou
claro que a estabilidade do valor
da moeda continua a ser um objetivo fundamental do país, o que
esfriou as expectativas de mudanças sensíveis e imediatas.
Muitos analistas consideram
que a novidade é apenas cosmética, destinada a aplacar temporariamente a fúria dos EUA e de outros países contra o artificialismo
cambial destinado a impulsionar
as exportações chinesas.
É possível que seja assim, mas
não aparece que seja o caso. Em
primeiro lugar, as autoridades
chinesas têm plena consciência
das fragilidades de seu modelo de
crescimento, ancorado em demasia nas exportações e com consumo interno muito baixo. Nos últimos dez anos, a participação do
consumo no PIB caiu de 45% para
apenas 35%, relação muito baixa
quando comparada à do restante
da Ásia (cerca de 50%), da Europa
e Brasil (65%) e dos EUA (71%).
É um objetivo das autoridades
aumentar esse percentual, em detrimento dos investimentos e das
exportações. Para isso precisam
adotar políticas de incentivo ao
consumo, que devem ser acompanhadas da criação de uma rede de
proteção social e valorização da
taxa de câmbio que induza a economia a investir mais em setores
ligados ao mercado interno.
Outro ponto importante é que a
persistência de superávits externos implicará acúmulo contínuo
de reservas internacionais, que
são investidas em títulos públicos
de países ricos -americanos e, em
menor escala, europeus. Ora, foi
justamente a incapacidade desses
países de continuar se endividando o fator de erupção da crise financeira. Será muito difícil para o
Ocidente aceitar que os chineses
continuem aumentando sua posição credora.
Do ponto de vista da China, certamente há fatores que sugerem
cautela na gestão do câmbio, entre eles os interesses constituídos
nos setores de exportação e as incertezas sobre a continuidade da
recuperação global. Mas não se
podem perder de vista os fatores
estruturais mencionados, que são
determinantes para um saudável
equilíbrio global.
Como disse Confúcio: "Não importa o quão devagar você esteja
indo, desde que não pare".
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