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Limites
CLÓVIS ROSSI
São Paulo - Até minha mulher, tucaníssima, embora crescentemente desiludida, atacou logo cedo, mal desci
para o café da manhã: "O presidente
chegou ao limite outra vez".
Estava se referindo ao texto em que
Fernando Henrique Cardoso dizia que
sua tolerância chegara ao limite.
Quando até uma tucana de carteirinha usa o "outra vez", sem disfarçar a
ironia, é porque a coisa está ficando
feia para o lado do presidente.
E a culpa é dele, só dele. No início do
mês, FHC já havia convocado todo o
ministério para dizer que chegara ao
limite. Não queria mais a guerrilha
interna que corrói o seu governo.
Quem não estivesse de acordo com as
diretrizes que pedisse demissão, chegou a insinuar o presidente.
Ingênuo e bem-intencionado como
sempre, ainda cheguei a perguntar a
um dos ministros se, dessa vez, era para valer. Claro que ele respondeu que
era. Não era, viu-se logo depois, no
episódio da posse do chefe da Polícia
Federal (agora, já ex-chefe), um certo
João Batista Campelo.
O ministro da Justiça, Renan Calheiros, fez um discurso de alguns segundos, de pura birra. Se o presidente fosse Wanderley Luxemburgo, Calheiros
já estaria cortado da "seleção" ministerial ("seleção", aí, é só por analogia).
Antes, durante sua mais recente excursão européia, FHC já havia dito
que estava cansado, uma outra forma
de dizer que chegara ao limite. Estava
cansado de impunidade, afirmou.
Mesmo cansado de impunidade, não
parece ter feito o menor esforço para
punir ou pelo menos descobrir os autores do dossiê Caribe e dos grampos
nos telefones de autoridades, nos
quais ele próprio se enredou.
Desconfio que o presidente se cansa
tanto dos limites porque ele próprio
ultrapassou todos os limites, primeiro
na montagem da coalizão com que governa há quatro anos meio e, depois,
na sinfonia de desacertos de seu governo, para usar uma palavra bem
suave.
Como não sabe mais quais são os limites, cansa-se deles com facilidade.
Azar do país.
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