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TENDÊNCIAS/DEBATES
A fusão Varig-TAM deve ser aprovada?
NÃO
Pela regulação do setor aéreo brasileiro
BETO ALBUQUERQUE
Fusão entre empresas é um processo de imensa responsabilidade.
Quando se trata de um setor estratégico
para um país ou um serviço de concessão pública, como o transporte aéreo, os
cuidados devem ser mais rigorosos.
O debate sobre a crise no setor aéreo,
em especial a fusão da Varig com a
TAM, não é novo na Câmara dos Deputados. Desde o ano passado coordeno
um grupo de trabalho na Comissão de
Viação e Transporte, criado para analisar os problemas do segmento. Em várias audiências, ouvimos empresários,
trabalhadores e órgãos públicos responsáveis pela área. Mas o agravamento
da situação da Varig e os capítulos recentes do processo de fusão informal
das empresas levaram a Câmara se reunir no próximo dia 2, em comissão geral. O assunto também estará na pauta
da Comissão de Assuntos Sociais do Senado, no dia 27 deste mês.
Em tese, não sou contrário à consolidação de empresas no setor de transporte aéreo regular. Entretanto discordo do modelo de fusão elaborado pelo
banco Fator. Por isso tenho defendido a
análise do plano de reestruturação ampla, proposta alternativa das associações de trabalhadores da Varig para a
recuperação da empresa.
A proposta do banco conduz ao monopólio, pois coloca nas mãos de uma
só empresa 67% das linhas domésticas e
99% das rotas internacionais. A dependência de uma corporação produzirá
consequências graves. Primeiro para o
usuário, que ficará sujeito a reajuste de
tarifas, à redução do número de vôos
ofertados e de localidades servidas e à
queda na qualidade do serviço.
Segundo, para os 13.250 trabalhadores
da Varig. Pela proposta, eles não estão
incluídos no rol de credores da nova
companhia, ao lado de instituições públicas e privadas. Muito embora, entre
créditos trabalhistas e o fundo de pensão Aerus, os funcionários tenham a receber cerca de R$ 2,5 bilhões. Outro
problema é a previsão de 6.000 demissões. Questiono também a razão do desequilíbrio na participação acionária de
cada empresa na nova sociedade. Em
vez de utilizar o critério da margem de
contribuição de cada companhia, o
banco Fator considera o patrimônio líquido estático.
Reconheço a gravidade da situação vivida pela Varig. Infelizmente, é preciso
dizer que o pesadelo por que passa a
companhia, nos seus 76 anos, é resultado, em boa parte, de gestões desastrosas
da Fundação Ruben Berta, controladora da empresa. É claro que, por muito
tempo, os interesses da corporação estiveram em segundo plano. Em números,
o saldo é de US$ 800 milhões em débitos
atrasados e há um prejuízo de R$ 2 bilhões. Em 2001, a gigante da aviação
brasileira faturou R$ 7,5 bilhões. Com
certeza, a atitude dos dirigentes da fundação no último ano comprometeu a
busca de soluções mais interessantes.
Mas, se a saída para a crise da Varig
exige o combate aos sérios problemas
internos, há também a obrigação de assegurar o padrão técnico-operacional
que a tornou referência internacional.
Quem conhece esse mercado sabe que o
padrão de qualidade da Varig não resistirá sob o novo modelo proposto. Existem também causas externas que levaram a Varig a essa situação, como a desregulamentação total do setor no governo Collor de Melo e as violentas desvalorizações cambiais no governo de Fernando Henrique Cardoso.
Porém é evidente que a crise não se limita a uma empresa, mas atinge todo o
setor de transporte aéreo brasileiro e
mesmo internacional. A começar pela
aposta de governos passados na idéia de
que as leis de mercado garantiriam um
modelo equilibrado. O que se revelou
um equívoco. A maioria das empresas
nacionais desse segmento tem adotado
modelos inadequados de governança e
má gestão. O mais grave, porém, é a ausência histórica de uma política nacional para a aviação. Os níveis atuais de
descontrole do setor são inconcebíveis.
Para mudar essa realidade, é preciso
estabelecer um marco regulatório capaz
de garantir concorrência saudável entre
as empresas e serviços de qualidade e
segurança, a preço justo, para os usuários. A organização do setor também
depende de condições mínimas definidas pelo Estado. Cito a revisão de tributos e taxas, a proteção à variação cambial, linhas de crédito mais acessíveis
para investimentos de longo prazo etc.
O governo do presidente Luiz Inácio
Lula da Silva, por meio dos ministérios
da Defesa e do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior, estuda
uma proposta de marco regulatório. Ao
mesmo tempo, o BNDES aguarda a
conclusão das negociações entre a Varig
e a TAM para analisar a conveniência de
sua participação no negócio e no adequado modelo para o caso.
Cabe reforçar que, no caso da Varig,
qualquer solução deve assegurar liberdade de concorrência, manutenção de
empregos, respeito aos direitos dos trabalhadores e qualidade nos serviços.
Uma coisa é certa: não vamos comer
prato feito pelo banco Fator.
Luiz Roberto de Albuquerque, 40, advogado,
é deputado federal pelo PSB-RS. Foi secretário
dos Transportes do Rio Grande do Sul (governo
Olívio Dutra).
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