São Paulo, quarta-feira, 23 de agosto de 2006

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Nova oportunidade

Com sanguessugas, Congresso tem mais uma chance de frear desgaste em sua imagem após absolvições do mensalão

DA PRIMEIRA vez, a renúncia não foi uma boa estratégia: os deputados que se desligaram do cargo para evitar a cassação teriam grande chance de ser absolvidos. Dos 19 parlamentares processados por envolvimento no mensalão, apenas três perderam o mandato.
O cálculo parece ter pesado entre os sanguessugas e demais envolvidos na máfia das ambulâncias. Dos 72 parlamentares acusados, apenas dois optaram pelo desligamento voluntário. Todos os outros -67 deputados e três senadores- preferiram enfrentar o processo. Depende apenas do Congresso corrigir o prumo e evitar que a leniência se repita.
São abundantes as provas para justificar o afastamento da maior parte dos acusados de adicionar emendas ao orçamento em troca de propina. Recibos, assinaturas, notas fiscais, contratos -é vasta a galeria de indícios apurada pela CPI. A expressão está desgastada, mas é a que melhor reflete a situação: sem "cortar na própria carne", o Congresso não terá como esboçar uma reação à gravíssima crise de legitimidade em que submergiu.
O prognóstico não é otimista. O ano eleitoral turva prioridades, paralisa votações importantes e reduz sensivelmente a presença dos parlamentares em Brasília. Nesse período que antecede às eleições, qualquer avanço no andamento dos processos é digno de comemoração.
A manutenção do voto secreto nas sessões em plenário apenas piora o quadro: sem que fique pública a opinião e o voto de deputados e senadores a respeito dos pares acusados, segue favorável o cenário para as absolvições. Deve-se também a esse dispositivo o desfecho decepcionante das últimas CPIs.
A repercussão de um corte em larga escala será decerto menor na próxima legislatura. Ainda que os processos continuem em andamento, só os deputados capazes de se reeleger correrão o risco de perder o mandato. Como os partidos não se mexem para negar legenda aos envolvidos em acusações, todo o esforço deve se concentrar no curtíssimo prazo: a rapidez, nesse caso, é mais um ingrediente a contar a favor da imagem do Congresso.
O papel do Ministério Público, da Polícia Federal e da Controladoria Geral da União não é secundário. Da ação coordenada entre essas instâncias depende a seqüência das investigações e a reunião de provas consistentes para enviar à Justiça. O caso é vultoso: envolve cerca de 600 prefeituras e diversas entidades privadas, cujo papel no esquema ainda está para ser esclarecido.
A condenação em âmbito político, traduzida na cassação do mandato dos envolvidos, é, porém, uma prioridade. Trata-se de uma sanção de forte poder simbólico: é a principal arma ao alcance do Congresso para recuperar sua credibilidade.


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