|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
LUIZ FERNANDO VIANNA
O Bataclã
RIO DE JANEIRO - Em "Gabriela, Cravo e Canela", Mundinho Falcão representa o novo, a alternativa
que sai do Rio para combater os velhos barões do cacau em Ilhéus.
Quando morre coronel Ramiro,
chefe político local, Mundinho assume o poder sem fazer concessões:
estende a mão para que o povo pobre a beije, alia-se aos coronéis, torna-se aquilo que combatia.
O retrato da velha Bahia feito por
Jorge Amado não envelheceu tanto
assim, descontados o figurino e alguns detalhes. Lula oferece em adoração as mãos simbolicamente
cheias de Bolsa-Família enquanto
beija literalmente as do coronel Jader Barbalho -que podiam ser as
de Ney Suassuna e de tantos outros.
Lula era, há apenas quatro anos, a
imagem do novo, espelhada nas
pessoas que enchiam Cinelândias,
avenidas Paulistas e ruas de terra
para comemorar a correção de uma
história destinada a ter sempre os
mesmos donos.
Hoje, Lula serve a esses donos para manter um projeto amorfo de
poder, alimentado nas entranhas
por Freuds, Gedimares, Valdebrans
e outras figuras de identidades e
funções estranhas.
Mas, se a quadrilha de Collor foi
desbaratada em 92, por que a de Lula resiste? É claro que a maior parte
da resposta se encontra no legítimo
apoio popular que ele tem, assentado sobre seu carisma, os programas
de transferência de renda e alguns
avanços econômicos.
Não é só. A única alternativa eleitoralmente viável é a sociedade
PSDB-PFL-parte do PMDB, que
produziu oito anos de iniqüidades.
É a aliança dos doutores dos rincões
com os coronéis da USP. Não espanta que Lula esteja na frente.
Em "Gabriela", há um terreno em
que cacaueiros, oposicionistas, malandros e jornalistas convivem à
beira da civilidade: o bordel Bataclã.
O governo Lula dá uma saudade danada da Maria Machadão.
Texto Anterior: Brasília - Fernando Rodrigues: O escravo das "qualis" Próximo Texto: Rogério Gentile: Passeio de cadela Índice
|