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Dane-se o público
Convênios da Petrobras são mais um exemplo de aparelhamento do Estado sob a gestão de Luiz Inácio Lula da Silva
FICOU EXALTADO o presidente da Petrobras na terça-feira. Não se sabe se as
notícias a respeito de patrocínios "companheiros" oferecidos pela estatal complicaram a
chance de Sergio Gabrielli ocupar um ministério no segundo
mandato -mas o fato é que ele ficou bastante destemperado. O
que deveria ser uma entrevista
coletiva para explicar alguns
contratos e convênios da petroleira tornou-se algo mais próximo de uma sessão de vitupérios.
Gabrielli acusou órgãos de imprensa de praticarem "uma campanha orquestrada contra a Petrobras". Nomeou-os: esta Folha
e "O Globo" -que publicaram
reportagens revelando intrigantes conexões entre prestadoras
de serviço à estatal, transferências de recursos da Petrobras a
ONGs sem licitação e a campanha petista. Os dois jornais teriam sido "irresponsáveis" e praticado "jornalismo marrom".
O escárnio para com a opinião
pública ficou patente na frase
"Evidentemente, você não é uma
pessoa bem-vinda aqui", dita por
Gabrielli, um servidor do Estado, ao repórter do jornal carioca
ali presente.
Seria compreensível a ira de
Gabrielli caso o petista houvesse
demonstrado ter sido vítima de
injustiça nas reportagens contra
as quais vociferou. Nas poucas
vezes em que apresentou argumentos em vez de impropérios,
no entanto, nada do que disse
passou perto de desautorizar o
trabalho jornalístico nesse caso.
O fato é que, como mostrou esta Folha na edição de terça, políticos do PT receberam neste ano
R$ 2,5 milhões em doações eleitorais de cinco empresas associadas à ONG Abemi que mantêm contratos com a estatal. A
Abemi, por sua vez, assinou um
convênio de R$ 228,7 milhões
com a Petrobras, sem licitação,
para treinar 70 mil pessoas.
Outro fato, revelado por "O
Globo" no domingo, é que a estatal transferiu ao menos R$ 31
milhões, a títulos vários, a organizações não-governamentais
que apoiaram a campanha pela
reeleição de Luiz Inácio Lula da
Silva. Detectou-se curiosa concentração dessas ações em Sergipe, onde o ex-presidente da estatal José Eduardo Dutra concorreu ao Senado, tendo sido derrotado (campanha 68% financiada
por empresas que têm negócios
com a petroleira estatal).
Todas essas parcerias com organizações "companheiras"
-mais um episódio de aparelhamento do Estado que persiste,
na gestão petista, como fruto da
impunidade- dispensaram licitação pública. O critério adotado
foi, nas palavras de Gabrielli, "o
trabalho que as ONGs fazem".
O dirigente da estatal acha que
R$ 31 milhões são quantia irrelevante se comparada ao "impacto" total dos mais de R$ 20 bilhões em investimentos da Petrobras. Também considera ser
um exercício de "mau jornalismo" recorrer à prestação de contas de campanha, identificar as
empresas que fizeram doações
ao partido governista e buscar
suas relações com a Petrobras.
O episódio ilustra o grau de
desrespeito na cúpula do Executivo federal para com o direito
do cidadão de saber o que é feito
do seu patrimônio.
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