São Paulo, quinta-feira, 24 de janeiro de 2008

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KENNETH MAXWELL

Camas famosas

EM "O CASO do Hotel Bertram", um romance de Agatha Christie, a indomável investigadora Miss Jane Marple retorna ao hotel em que se havia hospedado durante uma visita a Londres na infância.
Ela se surpreende com o fato de que, passadas tantas décadas, nada tivesse mudado no Bertram's. Por isso, começa a suspeitar de se aquilo não passava de uma fachada por trás da qual tramóias de toda espécie se desenrolavam. O romance conta como Miss Marple deslindou os verdadeiros mistérios do Bertram's.
Quando ia a Londres, eu costumava me hospedar em um hotel como o Bertram's, o Basil Street Hotel, localizado em uma tranqüila ruazinha de Knightsbridge, entre a Harrods e a Sloane Street. Nada no hotel havia mudado desde o começo do século 20. O Basil continuava inteiramente eduardiano em termos de decoração, repleto de antiguidades, e era um lugar muito apreciado por idosas duquesas viúvas vindas da Escócia para uma visita à capital. Mas, no ano passado, o Basil sucumbiu aos valores imobiliários astronômicos que valem para aquela parte de Londres. Havia uma interessante conexão entre o Brasil e o Basil. O historiador José Honório Rodrigues costumava se hospedar lá. Em sua correspondência, publicada alguns anos atrás pelo Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro, existe um bilhete ao historiador britânico Charles Boxer, convidando-o para um jantar no Basil. Ou seja, eu estive em muito boa companhia.
Agora que o Basil não existe mais, nesta semana estou hospedado no Cadogan Hotel, um pouco adiante na Sloane Street. O antigo porteiro do Basil se transferiu para lá, e por isso sou recebido como um velho amigo. O Cadogan tem uma história movimentada. Era aqui que o rei Eduardo 7º, quando ainda príncipe de Gales, costumava visitar sua amante, Lillie Langtry. Em visita a um dos colégios da Universidade de Cambridge, recentemente, dormi no quarto que o príncipe Charles, o atual príncipe de Gales, usa quando volta à sua velha escola.
Não me ocorreu o pensamento de que estava saindo da cama usada pelo bisavô e sua amante para a cama freqüentada pelo bisneto e sua amante.
Mas, quando apanhei um táxi na King's Cross Station e pedi que o motorista me levasse ao Cadogan Hotel, ele me disse: "O senhor sabe o que aconteceu lá?". Eu respondi que sabia, claro: era lá que o rei Eduardo 7º se encontrava com a sra. Langtry. "Oh, não", ele disse. "Foi lá que Oscar Wilde foi preso".
O motorista estava certo. Assim, se acrescentarmos o famoso amante de Wilde, lorde Alfred Douglas, as camas famosas em que já dormi estão começando a parecer lotadas.


KENNETH MAXWELL escreve às quintas-feiras nesta coluna.


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