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GUSTAVO FRANCO
A hora e a vez do déficit zero
NO PASSADO, se dizia que a
política econômica era o resultado de um embate entre o ministro gastador, geralmente o do Planejamento, e o guardião
do caixa, o da Fazenda. As coisas
mudaram depois do Real; o Banco
Central cresceu em importância,
ao passo que os gastadores se dispersaram em um grande número
de ministérios. A situação que hoje
temos é simples: a política fiscal é
do presidente da República, o único que desempata os gastadores, e
a política monetária é do BC, onde,
em última instância, está o freio.
Foi do presidente a feliz decisão
de manter, desde 2002, as metas
fiscais que vinham desde o acordo
com o FMI em 1998, e com isso pudemos tirar proveito do vento a favor vindo do exterior -e há vários
anos a economia vai bem.
Todavia o sucesso continuado
vai produzindo a necessidade de
mexer no time, ou na tática, mesmo com o placar favorável. O adversário está crescendo -inflação,
juros, déficit em conta corrente-,
e a comissão técnica precisa tomar
uma providência antes de a torcida
começar a se impacientar.
O Brasil tem hoje um quadro
evidente de excesso de demanda.
Estão circulando teorias complexas sobre o caráter global da inflação; para isso é bom lembrar as palavras de um sábio do passado: inflação não tem caráter.
O excesso de demanda foi se materializando com o sucesso da política econômica e com o crescimento cada vez maior do gasto privado
de consumo e investimento. Como
o gasto público tem crescido também de forma avassaladora, eles
não cabem dentro do mesmo PIB.
Tem-se uma clássica inconsistência macroeconômica: um elevador
cheio, dentro do qual, para entrar
mais um programa do governo, é
preciso que o mesmo tanto de gasto privado seja retirado. O assunto
aqui é matemático. O elevador carrega um peso máximo, fixado pela
prefeitura e que está inscrito na
convenção do condomínio. O BC
funciona como o porteiro do prédio, que adverte o grupo de que, ou
todos vão emagrecer rapidamente
por meio de inflação, ou os juros
vão ser aumentados até que alguém desista de subir.
É como o avião com "overbooking": 150 passageiros reservados,
públicos e privados, e cem lugares.
Se trabalhar direito, o BC vai fazer
com que 50 passageiros desistam
de viajar, para que os novos projetos públicos, causadores do problema, possam voar. Se não trabalhar
direito, vai tentar viajar com 150
onde cabem cem, o que resulta em
riscos incomensuráveis.
Está nas mãos do presidente fazer a coisa certa, que é ajustar as
metas fiscais de 1998 para cima,
possivelmente fixando como meta
o déficit zero -e desse jeito, sem
adjetivações. Afinal, déficit também não tem caráter.
gh.franco@uol.com.br
GUSTAVO FRANCO escreve aos sábados nesta
coluna.
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