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RUY CASTRO
Carros demais
RIO DE JANEIRO - Há medidas ousadas no ar. No Rio, o prefeito
Eduardo Paes quer fechar ao trânsito a avenida Rio Branco e transformá-la num boulevard para pedestres. Em São Paulo, o prefeito Gilberto Kassab quer pôr abaixo o Minhocão e revitalizar a enorme área
degradada pelo viaduto.
As propostas alvejam o pior inimigo do homem e das cidades modernas: o carro. A ideia é tirar o
maior número de veículos das ruas,
deixando-as para o cidadão e para
os veículos que precisam circular,
como táxis, ônibus, ambulâncias e
caminhões de serviço. Supõe-se
que, para complementar as medidas, os prefeitos criarão faixas exclusivas, abrirão mergulhões e incrementarão o transporte coletivo.
Nos dois casos, trata-se de reduzir a hostilidade das cidades e devolvê-las a um tempo em que eram
mais amenas e humanas. A avenida Rio Branco, por exemplo, quando inaugurada -em 1904, chamada avenida Central-, nasceu como
um boulevard. Em suas calçadas
povoadas por cafés (dos quais o Nice era apenas o mais famoso), fechavam-se negócios, empresas mudavam de mãos, tramavam-se golpes de Estado -enfim, decidiam-se
os destinos do Brasil. Enquanto isso, na mesa ao lado, alguém vendia
um samba ou discutia futebol. A vida corria em torno.
Hoje essas decisões são tomadas
nas catacumbas de Brasília, sem
conexão com a vida real. Uma delas, a de entupir o Brasil de carros,
com o crédito a perder de vista,
pouco ligando para o fato de que
eles estão tornando impraticáveis
as cidades mais amorosas. Nas últimas semanas, estive em Joinville,
Porto Alegre, Curitiba, Belo Horizonte e Ouro Preto. Em todas, a
mesma queixa: carros demais.
Sei bem que tirar os carros da rua
lesa os direitos individuais de quem
pensa que não consegue viver sem
eles. Mas os nossos, dos pobres citadinos acuados, vêm sendo lesados há muito mais tempo.
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