São Paulo, sábado, 24 de julho de 2010

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TENDÊNCIAS/DEBATES

A emenda constitucional do divórcio direto acabou com a separação?

NÃO

Instituto é independente do divórcio

ALEXANDRE MAGNO MENDES DO VALLE

No dia 13 de julho de 2010, o Congresso publicou e fez vigorar a emenda constitucional nº 66, conhecida como "PEC do divórcio".
Nessa emenda, o legislador altera o parágrafo 6º do artigo 226 da Constituição de 1988, afirmando que "o casamento civil pode ser dissolvido pelo divórcio".
Com essa mudança, suprime a exigência do requisito temporal de um ano da separação judicial para o divórcio por conversão e de mais de dois anos de separação de fato para o divórcio direto.
Acaba com as espécies "divórcio direto e por conversão", mantendo apenas o gênero "divórcio", e faz emergir uma forte divergência no meio forense sobre a extinção da ação de separação judicial.
O quadro é de atordoamento dos operadores do direito de família, que tentam divisar os exatos reflexos da emenda e apostam que a pá de cal virá de uma futura construção pretoriana, por meio das decisões dos tribunais.
Aqueles que defendem a extinção da separação também sustentam que não há mais sentido para sua manutenção. Asseveram que a vontade do legislador seria a de manter os estados civis de casado e de divorciado, mas não o de separado.
Os adeptos dessa corrente consideram de fato a separação como acessória do divórcio por conversão. E, em direito, vigora a regra nas relações acessórias segundo a qual a extinção do principal resulta na automática extinção do acessório.
Entretanto, deixam de observar que a separação judicial sempre foi um instituto independente do divórcio, com previsão própria e autônoma no ordenamento civil.
No atual Código Civil, a separação tem a finalidade de dissolver a sociedade conjugal, pondo fim aos deveres de coabitação e fidelidade recíproca e ao regime de bens sem romper o casamento, facultando aos casais, de forma ímpar, o restabelecimento da sociedade a qualquer tempo.
O divórcio, a seu turno, dissolve tanto a sociedade conjugal quanto o vínculo conjugal. Põe fim ao casamento, sem oportunizar aos casais e à família, como um todo, qualquer hiato de tempo para reflexão sobre os efeitos do rompimento, nos sonhos e nos projetos de vida em comum.
Com a emenda, abre-se um espaço para o rompimento imediato do casamento. Assim, uma pessoa pode se casar em um dia e pedir o divórcio no seguinte.
O divórcio ganha independência da exigência de uma prévia separação judicial ou de fato, mas isso não significa que não possa ocorrer qualquer dessas duas hipóteses.
O que se deve refutar é a tese da extinção da separação, diante deste novo cenário, verdadeiramente preocupante, em que já se vislumbra uma possível banalização do casamento e um enfraquecimento das uniões conjugais.
A separação deixa de ser um antecedente lógico e necessário da espécie divórcio por conversão.
Surge, agora, como uma via judicial disponível para aqueles casais que pretendem interromper momentaneamente a relação conjugal, mas que não estejam seguros da vontade de pôr fim ao casamento e das consequências do rompimento do vínculo conjugal.
Para o expressivo segmento da sociedade que não vê com bons olhos a presente alteração do sistema, resta a separação judicial ou extrajudicial (nos cartórios) como via legal capaz de emprestar um fôlego a mais de vida para o casamento nas relações familiares.
Um espaço aberto para o diálogo conjugal com a interrupção da sociedade conjugal, mas sem a incontinente aniquilação do vínculo do casamento.


ALEXANDRE MAGNO MENDES DO VALLE é juiz da 3ª vara de família de Uberlândia (MG) e professor da Faculdade Católica de Uberlândia.

Os artigos publicados com assinatura não traduzem a opinião do jornal. Sua publicação obedece ao propósito de estimular o debate dos problemas brasileiros e mundiais e de refletir as diversas tendências do pensamento contemporâneo. debates@uol.com.br


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