São Paulo, segunda-feira, 24 de agosto de 2009

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

O texto abaixo contém um Erramos, clique aqui para conferir a correção na versão eletrônica da Folha de S.Paulo.

TENDÊNCIAS/DEBATES

Os artigos publicados com assinatura não traduzem a opinião do jornal. Sua publicação obedece ao propósito de estimular o debate dos problemas brasileiros e mundiais e de refletir as diversas tendências do pensamento contemporâneo. debates@uol.com.br

Passeatas e transtornos na cidade de SP

LUIZ FERNANDO RODRIGUES PINTO JUNIOR


A população de SP não pode mais tolerar que grupos tragam o caos aos demais sem que se responsabilizem por suas ações

O HUMOR nosso de cada dia e as atividades cotidianas estão irmanados de forma siamesa ao trânsito da cidade de São Paulo.
Para atender compromissos e agendas, a antecedência de algumas horas é mais do que comum. Como agravante, nos deparamos cada vez mais com eventos que prejudicam a dinâmica urbana: manifestações públicas geradoras de constantes interrupções do trânsito, fechamento de ruas, avenidas, marginais etc. promovidas por setores (organizados ou não) que visam chamar a atenção para alguma pretensão (por vezes legítima) por meios absolutamente nocivos à metrópole.
A Constituição Federal prevê direitos fundamentais, dos quais cito dois:
o de reunião (artigo 5º, inciso XVI), como direito de ação coletiva que visa à concretização de propósitos comuns aos que dela participam voltados para sua própria razão de existir, sendo pacífica e com prévio aviso à autoridade competente; e o de locomoção (artigo 5º, inciso XV), o direito de ir e vir sem ser molestado, inclusive nas vias públicas.
É certo que os bens de uso comum do povo, como ruas e avenidas, não podem ser objeto de restrições estatais ou particulares, ressalvadas as exceções legais da disciplina do uso daquele espaço.
Entretanto, em São Paulo, há constante violação de tal comando por manifestações públicas, ora organizadas por entidades sindicais, ONGs, movimentos sociais ou outros, ora sem organizadores identificados.
Também costumam acontecer sem aviso formal à autoridade pública ou, quando esta é avisada, sem que os manifestantes sigam as orientações dos responsáveis.
Como consequência, temos constantes tumultos em confrontos dos manifestantes com a polícia, congestionamentos quilométricos, perda de tempo precioso no socorro a vítimas por ambulâncias e no atendimento a emergências pelos bombeiros.
Resumo da ópera: transtornos de toda ordem para a população.
Os direitos fundamentais não são absolutos e, se colidem, a doutrina refere mecanismos de convivência.
Mas, fugindo da discussão acadêmica, o importante é lembrar que há duas leis e dois decretos em São Paulo (leis 12.151/96 e 12.153/96 e decretos 35.329 e 36.767) que obrigam que a CET (Companhia de Engenharia de Tráfego) seja comunicada com antecedência no caso de manifestações públicas que prejudiquem a circulação de veículos, com texto específico para a avenida Paulista.
Consta dos comandos que o fluxo de tráfego não pode ser totalmente interrompido e, no mínimo, um espaço do leito carroçável deve ficar livre.
No entanto, recordo-me de ter visto, no início do ano, manifestação defronte ao Masp em que a locutora no alto do carro-chefe da passeata bradava, com orgulho, que estavam "fechando a avenida". Um absurdo.
Tais atitudes merecem resposta firme das autoridades, e há precedentes:
lembro, dentre outras, ação civil pública do Ministério Público contra um sindicato de ferroviários e seus dirigentes (individualmente) por uma passeata de 1997, em que reivindicavam reajuste salarial para a categoria -e não se discute aqui a legitimidade da pretensão- quando bloquearam totalmente a av. Paulista e outras vias, com paralisação do trânsito e danos difusos comunicados pela CET.
O Judiciário reconheceu o prejuízo à população e, da ação, resultou cobrança efetiva de R$ 141,7 mil em favor do Fundo Estadual de Reparação dos Interesses Difusos, que gere os recursos destinados à reparação dos direitos difusos ou coletivos no Estado.
Assim, sempre que manifestações causarem interrupção do trânsito, com fechamento de ruas ou avenidas sem comunicação às autoridades ou, ainda que avisadas, a disciplina seja violada, cabe a responsabilização dos organizadores.
Se, por hipótese, for inviável determinar tal identidade, os policiais que acompanham a manifestação, verificando violação da lei e da ordem, podem e devem identificar individualmente tantos quantos manifestantes puderem, em especial as lideranças, para que se possa cobrar judicialmente os prejuízos, com responsabilidade individual e solidária.
A população paulistana não pode mais tolerar que grupos, em nome de interesses de categorias específicas, tragam o caos aos demais cidadãos sem que arquem com a responsabilidade por suas ações.
Urge um alerta aos que pretendem exercer o direito de manifestação com passeatas ou por outros meios de que há respaldo legal, desde que respeitados os limites previstos, sob pena de sanções severas, e outro alerta às autoridades, para que exerçam a fiscalização e promovam as ações correspondentes para que a lei seja cumprida, e a sociedade, respeitada.


LUIZ FERNANDO RODRIGUES PINTO JUNIOR, 45, é promotor de Justiça do Patrimônio Público e Social e diretor da Associação Paulista do Ministério Público.


Texto Anterior: TENDÊNCIAS/DEBATES
Aldo Pereira: Vote zero! Vote zero?

Próximo Texto: Painel do Leitor
Índice


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.