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MARCIO AITH
A penhora da soberania
SÃO PAULO - Foi-se o tempo das moratórias com final previsível. Aquelas
que motivavam negociações com
grupos seletos de bancos e se encerravam na reinserção das nações nos
mercados de capitais, ainda que em
condições desfavoráveis a elas.
Naqueles velhos tempos, restava
aos poucos credores que se negavam
a aderir ao acerto a opção da lenta e
ineficaz justiça internacional.
Décadas se passaram desde então,
criando uma realidade assustadora
para a soberania dos países devedores. A sofisticação dos mercados financeiros pulverizou os credores, dificultando a obtenção de um consenso entre eles. Além disso -o que é
pior-, cortes de Nova York e de países europeus criaram o entendimento
de que um credor pode penhorar no
exterior, de forma rápida, bens públicos essenciais de países devedores.
A moratória argentina, a maior da
história em volume e em complexidade, evolui nesse novo contexto. Com
um agravante: para captar recursos
em dólar, o ex-presidente Carlos Menem incluiu, em grande parte dos títulos emitidos por seu país, a renúncia expressa à imunidade diplomática. Ou seja: reforçou o direito dos credores à penhora de salários de diplomatas argentinos, de imóveis no exterior e de recursos enviados para pagamento de aluguéis e de dívidas que
o país julga legítimas.
No último mês, o presidente Néstor
Kirchner cancelou viagem à Alemanha e à Itália porque credores ameaçaram arrestar o avião presidencial.
Além disso, para evitar a penhora de
salários, o país passou a pagar seus
diplomatas em espécie, por malote.
Não se via esse método desde que
banqueiros de Florença e de Gênova
criaram instrumentos financeiros e
contábeis básicos, no século 15.
Essa nova realidade está tirando
das nações emergentes os poucos benefícios das moratórias. É como se a
Justiça de países ricos estivesse tentando coibir o direito das nações em
desenvolvimento à eutanásia.
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