São Paulo, segunda-feira, 24 de outubro de 2005

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TENDÊNCIAS/DEBATES

Corrupção: prevenção e transparência

WALDIR PIRES

Ultimamente a mídia tem aberto espaço para uma questão que considero oportuna e que precisa ser bem entendida pela sociedade. Pergunta-se, no centro dessa questão, onde estavam e o que faziam os órgãos de fiscalização do governo e do Estado brasileiro -TCU, TSE, CGU, Ministério Público e Coaf, entre outros que teriam a obrigação de antever e prevenir as irregularidades alardeadas e amplificadas incessantemente há mais de quatro meses.


Não somos ingênuos para pensar que vamos acabar com a corrupção ou que podemos preveni-la de forma absoluta


De fato, o Estado brasileiro, seja na esfera federal, estadual ou municipal, jamais se organizou para o combate à corrupção. Nunca, anteriormente, se decidira a articular e mobilizar ações políticas de prevenção e dissuasão da corrupção para coibir a impunidade indecorosa e antiga. Para promover a transparência ampla dos gastos públicos, a participação da cidadania no controle social eficaz, e assim construir a credibilidade da democracia, com suas instituições capazes de realizar a inclusão social e a justiça humana. Essas iniciativas, assentadas nos princípios da publicidade e da impessoalidade, começam, caminham e vão se implantando exatamente no atual governo, do presidente Lula.
Na maioria dos Estados e municípios nem sequer existem secretarias ou departamentos especificamente encarregados da prevenção e combate à corrupção. No governo federal, até recentemente havia apenas uma Secretaria Federal de Controle Interno, desprestigiada e esvaziada (com dois terços dos seus cargos vagos, salários defasados e sem nenhum reconhecimento público) e uma incipiente corregedoria, criada em hora de crise apenas para atuar no recebimento de denúncias, isto é, com caráter corretivo, jamais preventivo.
As ações de prevenção, como se sabe, não produzem resultados imediatos. No entanto, algum dia ter-se-ia que iniciar essa mudança de enfoque. E hoje podemos dizer que estamos promovendo, como nunca se fez antes, uma verdadeira revolução em matéria de transparência. Criamos o Portal da Transparência (www.portaldatransparência.gov.br) que informa ao cidadão sobre todos os gastos do governo federal, sejam aqueles por ele diretamente executados, sejam os custeados pelas transferências a Estados e municípios. Hoje, são já disponíveis aos cidadãos mais de 250 milhões de informações. Em breve, tornaremos disponíveis, no portal, informações sobre os financiamentos autorizados pelas instituições financeiras públicas e as faturas dos cartões de pagamento do governo federal (cartões corporativos). Tudo isso sem necessidade de senha de acesso e em linguagem simples e acessível ao leigo.
Há mais. A partir do próximo ano, por decreto do governo, os relatórios das auditorias realizadas pela Controladoria nos órgãos federais estarão disponíveis nos sítios eletrônicos dos órgãos auditados, com as irregularidades ou ressalvas apontadas pelo órgão de controle. Sem segredos. Todos os ministérios terão sua própria página de transparência, com os dados sobre licitações, contratos, convênios, diárias e passagens, a exemplo do que já faz o Ministério da Justiça.
O governo do presidente Lula criou e instalou, também, no âmbito desta Controladoria, o Conselho Nacional de Transparência Pública e de Combate à Corrupção, integrado paritariamente por representantes de órgãos públicos e de entidades da sociedade civil, instituído para discutir e sugerir medidas que aprimorem e reforcem as políticas e os mecanismos de transparência da gestão pública e de combate à corrupção.
Investimos cotidianamente na participação e no estímulo ao controle social. Instituídos em nosso governo, de forma inédita, os sorteios públicos para fiscalizações em municípios são verdadeiros exemplos de cidadania. Nossos auditores são recebidos sob aplausos da população. Temos identificado e combatido, nessas ações, uma variada tipologia de desvios de recursos públicos. Não nos limitamos a verificar papéis. Fiscalizamos a materialidade constatada do dinheiro público aplicado. E buscamos também capacitar e formar cidadãos comprometidos com o controle dos gastos públicos. Institucionalizamos programas de capacitação de agentes públicos, conselheiros e lideranças municipais.
Um fato é inegável: nunca se combateu tanto a corrupção neste país. Mas não somos ingênuos para pensar que vamos acabar com a corrupção ou que podemos preveni-la de forma absoluta, muito menos no espaço de um mandato. Esse é o típico discurso deletério, que ao longo de séculos, não permitiu ao Brasil avançar.
A corrupção é um fenômeno global do qual não estão a salvo nem mesmo países do chamado Primeiro Mundo. Basta lembrar que bem recentemente Tom DeLay, líder dos republicanos na Câmara dos Deputados dos Estados Unidos, foi apeado da função sob acusação de formação de quadrilha e caixa dois. A corrupção é um crime como é o homicídio. Não se acaba. Combate-se, dura e tenazmente.
As dificuldades são muitas, mas tenho a convicção de que estamos no caminho certo e contribuindo de forma vigorosa para a consolidação da democracia brasileira e para a construção de uma sociedade melhor.

Waldir Pires, 78, advogado, é o ministro do Controle e da Transparência. Foi deputado federal (91-95), governador da Bahia (87-89) e ministro da Previdência Social (governo Sarney).


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