São Paulo, terça-feira, 24 de outubro de 2006

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ROBERTO MANGABEIRA UNGER

29 de outubro

HÁ NO PAÍS desejo intenso de ingressar em etapa nova de nossa vida nacional: etapa marcada por ampliação decisiva de oportunidades econômicas e educativas, por predominância dos interesses de trabalhadores e produtores sobre os interesses de rentistas e por reorganização da democracia brasileira para livrá-la da sombra corruptora do dinheiro. A reeleição do presidente tornou-se instrumento desse desejo.
Entre as forças políticas que se reúnem em torno dessa causa, começa a emergir consenso mudancista com feições próprias. Respeitar o imperativo do realismo fiscal, abandonando a ilusão de que haja maneira rápida e responsável de baixar a carga tributária ou o gasto público, a não a ser o gasto, tremendo, em juros.
Reconhecer que as pequenas transferências de recursos aos mais pobres não bastam para libertar o povo brasileiro: é preciso tirar a camisa-de-força do juro alto e do câmbio baixo, pôr fim à dualidade de trabalho formal e informal e usar os poderes e recursos do Estado para abrir, em favor de dezenas de milhares de empreendimentos emergentes, o acesso a crédito, tecnologia e mercados.
Tratar a melhora da qualidade da educação pública como prioridade da política social. Para isso, impor, sob responsabilidade federal, mínimos de investimento por aluno e de desempenho por escola em todo o país e substituir ensino enciclopédico por ensino analítico e capacitador. E tomar quatro iniciativas destinadas a assegurar o espaço republicano de que precisamos para enfrentar nossos problemas: financiamento público das campanhas, reorganização do processo orçamentário, mudança do regime eleitoral e substituição da maioria dos cargos comissionados por carreiras de Estado.
O Brasil está pronto para esse projeto. Está disposto a sacrificar, desde que a construção de oportunidades para trabalhar, aprender e participar legitime o sacrifício. A provável degeneração do quadro internacional, com diminuição da liqüidez e acirramento dos conflitos e das ameaças, o sentimento de que a fórmula das políticas emergenciais no econômico e no social se esgotou e a impaciência para crescer e para criar -tudo aponta na mesma direção. Falta traduzir a tarefa em iniciativa.
Temos o recurso indispensável: vitalidade. Escreveu o poeta-profeta Hoelderlin: quem pensa mais profundamente ama o que tem mais vida. Quem por esse critério se pautar, terá paixão pelo Brasil. No 29 de outubro, o povo brasileiro reafirmará sua fé em si mesmo. E declarará sua intenção de exigir ímpeto transformador do governo da República.
www.law.harvard.edu/unger


ROBERTO MANGABEIRA UNGER escreve às terças-feiras nesta coluna.


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