|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
CLÓVIS ROSSI
O muro do conformismo
SÃO PAULO - Permito-me voltar
ao artigo do arquiteto Jorge Ricca
Jr., mestre pela Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da USP, que,
na quinta-feira, defendeu a derrubada do muro que separa o campus
da Universidade de São Paulo das
pistas da marginal do rio Pinheiros,
na zona oeste da cidade de São Paulo.
Ricca tem toda a razão ao qualificar de "espanto" o tal muro, mas o
meu ponto é outro. Esse "espanto"
é o motivo pelo qual sou o único
paulistano que conheço que não
tem orgasmos com a tal lei da cidade limpa, tida como um dos fatores
que ajudaram a reeleger o prefeito
Gilberto Kassab.
Não é que a cidade não tenha ficado mais limpa. Claro que ficou. Mas
não ficou mais bonita, o que seria
muitíssimo mais importante. E o
muro contra o qual se levanta Ricca
é a melhor prova: a retirada de cartazes não embelezou a área. Ao contrário, expôs o "espanto". Saíram os cartazes e entrou uma área verde,
um edifício histórico, uma praça
bacana?
Não. Só concreto, 2,3 km de comprimento por 3 metros de altura,
nas contas de Ricca, que esqueceu
de mencionar os ferros pontiagudos em cima, como se atrás houvesse um campo de concentração e não
um campus universitário.
Os profetas do conformismo,
maioria absoluta no Brasil, dirão
que o objetivo da lei não é o de embelezar São Paulo, uma cidade "carente de espaços públicos dignos,
embora rica de espaços privados
exclusivos", como diz Ricca.
Nem sei se ainda é possível embelezar São Paulo. Mas, se além de
aplaudir a cidade limpa, o paulistano brigasse por mais beleza, as coisas talvez começassem a andar. O
que não dá é aceitar que a cada chuva mais forte, haja inundações, como se fossem tão inevitáveis como
o carnaval ou a Semana Santa.
De todo modo, feliz Natal aos que
se conformam e mais feliz ainda aos
que querem sempre mais.
crossi@uol.com.br
Texto Anterior: Editoriais: Dinheiro que brota
Próximo Texto: Brasília - Fernando Rodrigues: 11 vezes crise Índice
|