São Paulo, sexta-feira, 25 de janeiro de 2008

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Em observação

São Paulo completa 454 anos com deficiências urbanas sérias, mas surge agora o embrião de um sistema para medi-las

SÃO PAULO chega ao 454º aniversário em estágio avançado de tensão. Apesar do rodízio municipal de veículos, o trânsito se engasga com cerca de 800 novos carros e motos por dia, que só agravam a poluição do ar. O transporte de massa é pouco, lento e falho.
O projeto de despoluição do rio Tietê tem 16 anos e já custou R$ 2,7 bilhões, mas seriam necessários outra década e mais R$ 2 bilhões para livrar a capital do portentoso esgoto a céu aberto. Enchentes e deslizamentos ainda pontilham o verão com prejuízos e tragédias.
Mesmo assim, subsistem razões para comemorar o aniversário da cidade nascida na região do "peixe seco", Piratininga. A metrópole de 10,9 milhões é uma cidade jovem para os padrões mundiais. Sobra-lhe vitalidade para levantar-se e dar a volta por cima, como se diz aqui. Basta mencionar cinema, moda e gastronomia como exemplos do dinamismo cultural da cidade.
Falta a São Paulo, porém, canalizar parte dessa energia a fim de reduzir os problemas que a tornam pouco habitável para uma grande parcela da população. Contam aí não só condições ambientais, mas um mínimo de justiça social, na forma de acesso a bens e serviços básicos. Em meio à barafunda bem paulistana de propostas e soluções urbanas mirabolantes, como o inesquecível Fura-Fila, a maior concentração de capacidade técnica do país não foi ainda capaz de produzir métodos racionais para avaliar o desempenho daqueles que elege para governá-la.
Prover a população de um sistema eficiente de autodiagnóstico é o cerne da iniciativa Observatório Cidadão. Anunciada ontem pelo Movimento Nossa São Paulo, conta com o apoio de 395 de entidades, entre as quais mais de 30 grandes empresas. A promessa é acompanhar sistemática e periodicamente 130 indicadores sobre a cidade, de desemprego e evasão escolar a mortalidade infantil e violência doméstica. Em paralelo, pesquisas de opinião recolherão avaliações dos próprios paulistanos sobre mais de 200 quesitos.
Segundo os organizadores, essa matriz servirá para fiscalizar de maneira objetiva a performance do governo municipal. Não só desta ou aquela administração, nem exclusivamente o prefeito ou a Câmara, mas também as subprefeituras. A meta é tornar conhecidos indicadores da desigualdade entre regiões urbanas, como o fato de Pinheiros ter mortalidade infantil de 6,6 óbitos por mil nascidos vivos e Parelheiros, de 18,4, portanto quase três vezes maior no bairro mais pobre. Daí surgiriam metas específicas, regionalizadas, para reduzir a iniqüidade.
Nada disso terá o condão de transformar São Paulo numa cidade mais agradável e menos injusta. A política não se resolve por números, mas tampouco pode prescindir deles. Manter governantes sob observação vigilante, com a lupa fria de cifras independentes e confiáveis, pode contudo revelar-se instrumento útil para aumentar o controle social e erradicar a lamúria com que às vezes se confunde, por aqui, o debate público.


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