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JOSÉ SARNEY
O bolso e a Bolsa
HELMUT SCHMIDT, talvez o
homem mais brilhante que
eu conheci, em uma reunião em Salzburgo do InterAction
Council, conselho mundial de ex-presidentes e chefes de governo, do
qual eu participo, fez uma exposição sobre o mercado financeiro, o
primeiro setor da economia a globalizar-se. Falou sobre o gigantesco volume de capital que gira nas
Bolsas de Valores, dia e noite, comandadas mais pelos computadores com seus programas inteligentes do que pela vontade dos homens e investidores, concluindo
que suas ações representam dez
vezes mais que a economia real.
Eu não entendo bem como isso
funciona, mas, ao longo de minha
vida, tenho presenciado muitas
crises nas Bolsas de Valores e muitos dias de euforia, uma coisa e outra definindo a saúde das economias dos países e, hoje, do mundo
inteiro.
Vivi nos anos 70 um desses momentos. Descobrira-se um poço
onde todos encontravam ouro: o
mercado de capitais, a Bolsa. Todo
mundo começou a vender tudo e
aplicar na Bolsa. Foi nesse tempo
que o Banco Nacional, do Magalhães Pinto, ganhou uma concorrência para lançar ações do Basa.
Ele chamou a mim e a Odylo Costa,
filho -uma das melhores e mais
bondosas criaturas que Deus fez
neste mundo-, e nos ofereceu, a
cada um, 5.000 ações, ao preço de
lançamento. Foi logo dizendo que
as ações iriam valorizar muito.
Ponderamos que não tínhamos dinheiro, e Magalhães mandou o
banco nos emprestar. Eu avalizei
Odylo e Odylo me avalizou. Dez
contos cada um. As ações subiram
e eu disse: "Vamos vender". Os experts recomendaram: "Esperem,
vai valorizar mais". Um dia, as
ações subiram tanto que Odylo me
convidou para almoçar e anunciou:
"Zé, estamos bem, vamos tomar
um bom vinho". Para encurtar a
história: dois anos depois, as ações
caíram e acabamos vendendo pela
metade do valor por que compramos, depois de ter pago por todos
esses meses os papagaios do banco.
Otto Lara Resende, que também
participou do pool de "investidores", encontrou o Magalhães e lhe
agradeceu: "O Banco Nacional foi
muito nosso amigo, a 4% ao mês".
Assim, nós conhecemos as crises
da Bolsa e do nosso bolso.
Agora, mais uma vez, leio as notícias do Brasil e de além-pátria,
umas anunciando a catástrofe e
outras a ausência dela. Uns acham
que é uma bolha que está arrebentando e tudo voltará ao normal.
Outros, que é uma crise estrutural
dos mercados e que a economia
americana vai puxar para baixo todas as outras. Nathan Blanche, da
Tendências Consultoria, diz que
com reservas de US$ 186 bilhões e
dívida externa de US$ 65 bilhões, a
crise para nós é café-com-leite.
Deus o ouça!
jose-sarney@uol.com.br
JOSÉ SARNEY escreve às sextas-feiras nesta coluna.
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