São Paulo, sábado, 25 de março de 2006

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ANTÔNIO GOIS

Em benefício próprio

RIO DE JANEIRO - Impressiona a capacidade humana de criar argumentos em benefício próprio. E de acreditar neles.
Nesta semana, juízes de Minas Gerais fizeram uma greve para protestar contra a resolução do Conselho Nacional de Justiça que limitava os salários no Judiciário. Ao explicarem os motivos, eles pareciam realmente indignados com o que chamaram de extrapolação da função do conselho. Outros juízes já haviam usado o mesmo argumento para protestar contra a resolução antinepotismo feita pelo mesmo órgão.
O mesmo tom de indignação apareceu nas declarações do general Francisco Albuquerque quando foi cobrado a explicar os motivos de ter exigido embarcar numa aeronave civil que já se preparava para decolar. A justificativa dada foi um protesto contra o overbooking da companhia aérea. Para a Comissão de Ética Pública, no entanto, foi mesmo um caso de "tratamento privilegiado".
Outro dia, um taxista no Rio puxou conversa demonstrando revolta com a decisão da prefeitura de exigir que os táxis cobrem dos turistas que sobem ao Corcovado apenas o valor da tabela. Se o trem que leva ao Cristo, dizia ele, cobrava R$ 30 de cada turista, por que o taxi não podia cobrar R$ 25 de cada passageiro?
No ano passado, na Urca, pacato bairro do Rio, moradores protestaram veementemente no jornal do bairro contra a instalação de um radar que limita em 40 km/h a velocidade em frente a um ponto de travessia de cegos. Para eles, no entanto, o objetivo era apenas tirar dinheiro dos motoristas.
Todos esses casos podem ser sintomas daquilo que o economista Eduardo Giannetti chamou em um de seus livros de auto-engano. O problema é que, em alguns casos, a linha que separa o auto-engano da falta de ética é tênue, muito tênue.


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