São Paulo, terça-feira, 25 de março de 2008

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MARCOS NOBRE

Réquiem para a MP

CRIADA PELA Constituição de 1988, a figura da medida provisória (MP) sofreu alterações importantes em 2001 e encontra-se agora novamente em discussão. Na situação atual, uma MP "tranca" a pauta do Congresso.
Sua vigência é imediata, mas tem de ser apreciada em até 60 dias, prorrogáveis por outros 60.
A quantidade de propostas de reforma é tão grande que um acordo não parece à vista. Fala-se em "trancamento disfarçado", prorrogação do prazo total de vigência para 150 dias, fixação de um limite máximo anual de edição de MPs e muitas outras coisas mais.
Quando as soluções mágicas são tantas, é de se desconfiar que o problema não esteja em achar um número certo, mas na própria coisa que se quer reformar. Não porque tenha havido "deturpação" do sentido original da MP, como se ouve muito dizer. É sempre prudente desconfiar de quem se coloca no lugar de guardião de um "sentido original" que só ele conhece.
A figura da MP serviu como importante instrumento de reorganização do sistema político brasileiro, esfacelado pela ditadura militar. Em um momento em que todo mundo achava que tinha razão e ninguém conseguia construir uma maioria sólida, a MP foi um elemento decisivo de imposição de um rumo. (Pode-se ou não gostar do rumo que as coisas tomaram.
Mas essa é uma outra história).
Se FHC tinha uma "maioria desorganizada", Lula tem uma "maioria casual". As MPs se transformaram no único instrumento eficaz para um governo acuado por um Congresso largamente indiferente, quando não hostil.
Quando isso aconteceu, a MP passou de instrumento de reorganização do sistema político a trava de avanços democráticos. É uma lástima que a TV Pública tenha sido aprovada dessa maneira, por exemplo, sem um debate minimamente informado. A sessão em que se deu a aprovação representa um dos maiores vexames da história republicana.
Para que a supressão da figura da MP seja efetiva é preciso que ela venha juntamente com as próximas eleições presidenciais e que não signifique um engessamento da execução orçamentária de qualquer governo. Seria razoável fixar uma porcentagem de remanejamento de recursos que o governo tenha de submeter a aprovação do legislativo. E, para além de se alcançar ou não uma fórmula para restringir a edição de MPs ainda sob o governo Lula, seria de decisiva importância suprimir definitivamente essa figura a partir de 2011.
Lula disse ser "humanamente impossível" governar sem MPs. Sem elas, pode ser que governar se torne "politicamente possível". Seria um avanço considerável.


MARCOS NOBRE 0escreve às terças-feiras nesta coluna.


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