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RUY CASTRO
Data marcada para morrer
RIO DE JANEIRO - Um querido
amigo morreu na semana passada,
depois de 15 dias no hospital. Nesse
período, que passou quase todo inconsciente, seu fígado, coração,
pressão e pulmões quiseram várias
vezes abandoná-lo. Teve também
alucinações. Os remédios que lhe
aplicaram paralisaram-lhe os rins.
Se não fosse tão forte, teria ido logo
embora. Até que nem ele aguentou.
Em certo momento, os contadores
dos mecanismos que tentavam
mantê-lo vivo foram zerando, um
por um. Tinha 50 anos.
A causa da morte, no relatório
médico, foi choque séptico-pulmonar. Mas, por trás desse diagnóstico
frio e neutro, havia 30 anos de consumo pesado de álcool e drogas, dos
quais os primeiros 20 foram uma
sucessão de festas, risos, frases rápidas, sucesso profissional e grande
apetite pela vida. A dependência, no
entanto, não deixa de cobrar a conta. E o pagamento é a vida.
Seu irmão, quase da mesma idade
e com o mesmo quadro, terá destino igual, com a desvantagem de que
sua vida nunca foi aquela euforia. A
namorada de meu amigo, alguns
anos mais nova, também não deve
durar muito tempo. Como não precisa trabalhar para viver, pode dedicar-se full time às substâncias que,
a esta altura, já nem lhe dão prazer
-apenas impedem que passe mal.
Outra amiga sua, exatamente de
sua geração, e o filho dela, de pouco
mais de 20 anos, gente de classe
média e berço fino, estão incrivelmente na cadeia, depois de um desastrado assalto a um taxista, de
quem tentaram levar a féria para
comprar cocaína. O ex-marido desta mulher, por sinal, há muito já viu
sua carreira profissional encerrada
pelo ácido. E por aí vai.
Há hoje uma grande incidência
de pessoas na faixa dos 50 com data
marcada para morrer. São os que
acreditaram que a década de 70 iria
durar para sempre. Os que viveram
para chegar até aqui, claro.
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