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Democracia turca
QUE O PARTIDO do premiê
turco, Recep Tayyip Erdogan, sairia vitorioso nas
eleições do último domingo, ninguém duvidava. A proporção do
triunfo, entretanto, surpreendeu
o próprio Partido da Justiça e do
Desenvolvimento (AK). Resultados ainda não-oficiais indicam
que o AK ficou com 47% dos votos, 13 pontos a mais que os 34%
obtidos no pleito de 2002.
A campanha da oposição bem
que tentou apresentar o pleito
como um embate entre o Estado
laico, por ela personificado, e o
islã, representado pelo AK. Era
uma interpretação verossímil.
Controvérsias entre o establishment secular e as massas religiosas são de fato uma questão relevante no país. Mais do que isso, a
própria eleição fora antecipada
porque os generais turcos haviam ameaçado com a possibilidade de intervir quando Erdogan
indicou um correligionário religioso para a eleição indireta à
Presidência da República.
Só que, como freqüentemente
ocorre, o eleitor turco acabou
dando mais atenção à economia
do que à metafísica. E, no plano
econômico, o AK tinha excelentes resultados a apresentar. Apanhou uma Turquia sob hiperinflação e, promovendo uma série
de reformas pró-mercado, transformou-a num país que vem
crescendo a 7% ao ano.
De resto, as acusações de que o
AK manteria uma "agenda religiosa secreta" soaram um pouco
falsas. É verdade que o partido
tem origem no islamismo político. Também é verdade que a mulher de Erdogan usa o "hijab", o
véu muçulmano -o que é visto
com desprezo pela elite laica.
Mas o partido, até por conhecer o
histórico dos militares que já
desferiram quatro golpes de Estado nos últimos 50 anos, em nenhum momento tentou reverter
a legislação que assegura a laicidade do Estado, tão zelosamente
defendida pelo establishment.
Com o resultado das urnas, as
reformas econômicas sob Erdogan ganharão fôlego e a controvérsia religiosa deverá seguir
sem solução definitiva.
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