|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
RUY CASTRO
Tiro nos biógrafos
RIO DE JANEIRO - Nesta semana, o presidente Lula disparou um
projétil endereçado ao Ministério
Público, à imprensa e a quem coubesse a carapuça, advertindo que,
numa investigação, se pensasse
"não apenas na biografia de quem
está fazendo a investigação, mas, da
mesma forma, na biografia de quem
está sendo investigado".
Sob a frase, dita em português do
planeta Bizarro, esconde-se uma
ameaça aos investigadores e/ou
biógrafos: cuidado com o tratamento aos ex-presidentes. Nominalmente, José Sarney -mas Lula poderia estar se referindo também a
seu novo aliado Fernando Collor ou
a seu subitamente cordial adversário FHC. Ou a si próprio, quando se
despir dos paramentos daqui a um
ano e meio.
Ele tem razão para se preocupar.
Acertou ao comparar uma biografia
a uma investigação. Há quem a chame, com impropriedade, de "pesquisa" -o que se aplica mais à fase
do mergulho em documentos, recortes e material já impresso. Mas,
se uma biografia fosse só isso, o biógrafo seria apenas um enviado especial ao arquivo.
A palavra correta é mesmo investigação -a localização de fontes vivas e primárias, as centenas de entrevistas e o escarafunchar pessoal
dos cenários, inclusive o dos crimes. Um biógrafo digno do nome
gasta a sola do sapato que nem um
detetive. E, em certas biografias, o
criminoso pode não ser o mordomo, mas o próprio biografado.
De Getúlio e JK para cá, nossos
ex-presidentes têm sido poupados
em biografias. A maioria só mereceu obras gerais sobre seus períodos de governo, algumas excepcionais, mas não biografias que os esmiuçassem como homens privados
e públicos. Quem sabe como era, digamos, o homem Garrastazu Médici por trás do frio ditador? E quando
saberemos quem foi o verdadeiro
presidente Lula por trás do pitoresco e folclórico cidadão?
Texto Anterior: Brasília - Igor Gielow: O tamanho do crime Próximo Texto: Cesar Maia: Choque e eufemismo Índice
|