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OTAVIO FRIAS FILHO
Fábricas de diploma
Durante muito tempo, o ensino
superior privado foi objeto de
ironias. Faziam-se as ressalvas de praxe em favor das ilhas de excelência conhecidas, e o restante era posto no
mesmo balaio de má-fé, exploração e
péssima qualidade de ensino. Virou
hábito falar em cursos universitários
por correspondência e faculdades de
fim de semana.
Esse panorama era e continua sendo
verdadeiro. A grande maioria das faculdades particulares oferece cursos
ruins, burla a determinação legal de
produzir alguma atividade de pesquisa, nem mereceria o nome de instituição de ensino superior. Muitas delas
certamente são fábricas de diplomas,
outra expressão que ficou famosa.
O jornalista Josias de Souza, entre
outros, tem mostrado que diversas
"faculdades" servem de fachada por
meio da qual empresários se beneficiam de isenções e outras vantagens. A
fiscalização deveria ser mais rigorosa
do que é. Mas parece ser hora, também, de vencer o preconceito que
condena em bloco toda a rede particular e ignora mudanças em curso.
Numa sociedade tão carente, as faculdades "ruins" têm prestado um
enorme serviço. Pelo país afora, elas
completam o aprendizado que corresponderia ao ensino médio, quase
sempre também precário, quando
não intermitente. Sabe-se que o deslocamento prossegue nos demais níveis:
o mestrado é a faculdade, o doutorado
é o mestrado.
Mas é essa a situação concreta, como
diria um "uspiano". O importante é
que os ocupantes de cada degrau do
ensino estejam motivados a disputar o
degrau imediatamente acima. Isso
vem ocorrendo graças à porosidade e
À onipresença das faculdades privadas, tão difundidas quanto os templos
evangélicos com os quais mantêm paralelos.
O diploma obtido nessas faculdades
torna-se uma alavanca de ascensão
social para jovens que trabalham, ajudam a família e têm ambições a realizar. Assim como despertaram hostilidade nas universidades públicas, as
avaliações introduzidas pelo governo
anterior foram levadas a sério nas particulares por pressão dos alunos. Às
vezes, o mercado funciona bem.
Essa pressão impulsiona a melhora
paulatina do padrão médio e o aparecimento, aqui e ali, de bons cursos.
Mas há outro fator de mercado. O esvaziamento das universidades públicas -combinação de cortes em áreas
menos "rentáveis" e de fossilização
ideológica entre os que se opõem a essa política- foi acelerado pelo medo
da reforma da Previdência.
Bons professores estão se transferindo do sistema público para o particular, atraídos também pela remuneração. É enganoso, aliás, supor que o sistema privado cresce à custa do outro.
Em uma década (1991-2001), o número de estudantes universitários dobrou -de 1,5 milhão para 3 milhões.
Mas a proporção deles nas escolas privadas se manteve estável (70%).
Tudo indica que fatores estruturais
produzirão, ao longo dos próximos
anos, um pelotão bem mais numeroso
de faculdades particulares consideradas de elite. Ajudaria se seus dirigentes
tivessem em mente que a prova dos
nove de uma verdadeira universidade
é o investimento que ela faz em objetivos não-imediatos e em saberes aparentemente inúteis.
Otavio Frias Filho escreve às quintas-feiras nesta coluna.
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