São Paulo, terça-feira, 25 de setembro de 2007 |
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TENDÊNCIAS/DEBATES Os riscos da emenda Suplicy PAULO SAFADY SIMÃO
DESNECESSÁRIO ressaltar as qualidades do senador Eduardo Suplicy. Ao longo de décadas, se firmou na galeria dos parlamentares mais trabalhadores, éticos e coerentes do Congresso. Permito-me, no entanto, discordar frontalmente do eminente parlamentar em relação ao seu relatório, apresentado na CAE (Comissão de Assuntos Econômicos), sobre a lei que propõe mudanças na atual legislação reguladora das licitações públicas no Brasil. Em artigo publicado nesta Folha ("Tendências/Debates", 18/9), o senador afirma que, de todos os projetos por ele relatados, esse foi o mais trabalhoso e o que assegurará melhores resultados. Disse, ainda, que apresenta significativas melhorias em relação ao projeto vindo da Câmara. Acredito que o senador está convencido de ter feito o seu melhor. De um lado, preocupou-se em atender ao governo, que buscava agilizar e tornar mais transparentes os processos licitatórios. De outro, amparado por seus assessores, concluiu que as opiniões dos deputados, dos depoentes da audiência pública e dos membros da CAE estavam equivocadas e não atendiam aos interesses do país. A prevalecer o relatório, lamentamos constatar que o senador Suplicy passará a ser sempre lembrado pela autoria da lei que paralisou as obras públicas no país e trouxe enormes prejuízos aos cofres públicos. Logo ele, que julga ter o Senado "um papel importante de equilíbrio entre as 27 unidades da Federação". A adoção do pregão para licitações públicas no Brasil representou um grande avanço. Resultou em agilidade, menor preço e redução dos desvios tão comuns nas compras governamentais. Ressalte-se que, até agora, os pregões se limitam, corretamente, aos chamados "bens de prateleira". Ou seja, bens que só serão pagos após o administrador público ter recebido e aprovado o bem licitado. Não é o caso das obras públicas, que são pagas em etapas e estarão de posse do Estado somente ao final do cronograma. O pregão, nesses casos, poderá resultar em preço inexeqüível e empresa pouco qualificada. Assim, as obras correm sérios riscos de serem abandonadas, com prejuízos ao contratante. Ao propor a obrigatoriedade de pregão para obras com valor de até R$ 3,4 milhões, o senador coloca em risco mais de 90% dos contratos de obras públicas do país. É bom lembrar que os órgãos públicos, na sua grande maioria, estão despreparados para cumprir seu papel nos certames licitatórios. Não seria mais prudente, caso se introduza o pregão para obras, testá-lo com o limite proposto pela Câmara (R$ 340 mil)? O mesmo se dá no caso da inversão de fases das licitações. O conhecimento prévio dos preços, sem submeter os licitantes a nenhum critério de seleção, comprometerá a isenção da análise da capacidade técnica e financeira dos participantes. Em ambos os casos haverá prejuízos para o Estado e ações na Justiça questionando resultados. Diferentemente do que afirma o senador em seu artigo, as empresas que se habilitarão às obras de até R$ 3,4 milhões não possuem "grandes departamentos advocatícios" que atrasam e inviabilizam licitações. Aliás, é bom frisar, na grande maioria das vezes, as empresas vão à Justiça apenas quando se sentem prejudicadas. Ou o edital está direcionado, ou mal formulado, ou o processo apresenta alguma outra deformação. Equivoca-se o senador ao propor pré-cadastramento para obras acima de R$ 3,4 milhões, para evitar aventureiros. Empresas habilitadas para obras maiores geralmente são experientes, financeira e tecnicamente aparelhadas, que dificilmente deixarão o Estado na mão. Os eventuais aventureiros estão exatamente entre as 100 mil empresas que vão disputar os contratos com valor de até R$ 3,4 milhões. Aí é que mora o perigo. Para encerrar, informamos que não corresponde à realidade a afirmação do senador de que as empresas de médios empresários são inteiramente favoráveis à adoção do pregão também para obras públicas. Como representantes das micro, pequenas e médias empresas de construção, temos manifestado a nossa posição contrária ao pregão em obras públicas. E, na eventualidade de sua aprovação, deveria ser precedido de proteções reais para o erário público. Com a palavra, senadores e deputados que ainda irão votar a matéria. Ainda há tempo de salvar as obras públicas. Ainda há tempo de salvar o senador Suplicy. PAULO SAFADY SIMÃO , 58, engenheiro civil, é presidente da CBIC (Câmara Brasileira da Indústria da Construção) e membro do Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social da Presidência da República. Os artigos publicados com assinatura não traduzem a opinião do jornal. Sua publicação obedece ao propósito de estimular o debate dos problemas brasileiros e mundiais e de refletir as diversas tendências do pensamento contemporâneo. debates@uol.com.br Texto Anterior: Frases Próximo Texto: Thomas E. Lovejoy e Gomercindo Rodrigues: A máquina de chuva da Amazônia Índice |
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