São Paulo, sábado, 25 de outubro de 2008

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JOÃO BATISTA NATALI

O síndico

OS PAULISTANOS elegem amanhã um novo prefeito, ao fim de uma campanha que terminou tão lastimável como começou: um simulacro da escolha de síndico do condomínio, sem propostas ambiciosas e integradas sobre políticas urbanas, saneamento, habitação ou justiça social.
E, sobretudo, de olhos fechados à crise financeira que baterá forte na arrecadação municipal.
Já para o primeiro turno a etiqueta de síndico se aplicava a Alckmin, combinando com suas estreitezas e com a identidade doutrinária titubeante do PSDB. Ele e os demais se beneficiavam por não precisarem se contrapor à clara linguagem da direita, já que um Maluf agora desdentado não conseguiria semear o medo dos bandidos e se limitava a circular, mais uma vez, com a absurda idéia de que governar é uma operação gerencial que acumula obras de ferro e concreto.
Se chegasse lá, faria estragos, o que o bom-mocismo ambiental de Soninha prometia consertar.
Havia ainda o PT, que chegou duas vezes à prefeitura por agregar o voto útil ao núcleo insuficiente de eleitores necessários para derrotar o malufismo. Sem esse roteiro, quis crescer para os lados da classe média do centro expandido. E se despolitizou. A ponto de Marta acusar Kassab de furtar suas idéias, forma indireta de considerá-las intercambiáveis entre os diversos segmentos sociais de condôminos e de também vê-las -o que é rigorosamente verdade- sem a antiga marca registrada da esquerda.
Kassab não tinha nada a oferecer em termos políticos. Passou a borracha em sua biografia e guardou na gaveta, enquanto pode, sua integração aos planos de poder de Serra. Sua agenda de candidato e seu horário eleitoral, de longe os mais engenhosos, passaram então a insistir na idéia de gerenciamento despolitizado da cidade.
Mas não há entre todos eles uma equivalência simétrica. O divisor das águas eticamente poluídas partiu desta vez do PT, com as insinuações sobre o adversário do segundo turno. Na lógica que leva os marqueteiros a se tornarem mais poderosos que o histórico (ou o mito do histórico) de um partido, a candidata acabou por emporcalhar sua biografia. Será uma das muitas razões pelas quais ela hoje poderá pagar um alto preço por isso.
A mais que provável reeleição amanhã do insosso Kassab (mérito para sua imagem: ela não é indigesta) não trará para São Paulo um diferencial importante. Ele e Marta administrariam o município de modo semelhante, em companhia de uma multidão de burocratas do segundo escalão que procura há mais de duas décadas fundir a idéia de contracheque com o exercício partidário do poder.

JOÃO BATISTA NATALI é repórter da Folha. Hoje, excepcionalmente, não é publicado o artigo de Gustavo Franco.



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