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DEPOIS DO VÉU
Depois do véu, a barba. A decisão do governo francês de
proibir o uso de símbolos religiosos
ostensivos na escola pública começa
a mostrar problemas. Como admitiu
o ministro da Educação Nacional,
Luc Ferry, diante da comissão que
prepara a lei de laicidade nas escolas,
se muçulmanos transformarem a
barba num símbolo religioso, ela
também precisará ser banida dos estabelecimentos oficiais de ensino.
Para o ministro, o "arbitrário dos signos (...), que permite inventar signos
a partir de uma simples pilosidade",
exige que a lei seja vaga para poder
enquadrar casos imprevistos.
Não é, porém, preciso recorrer à
lingüística para perceber que uma
eventual proibição das barbas representa um forte golpe contra as liberdades individuais. De fato, a novela
da proibição dos véus começa a
adentrar o terreno do grotesco. O
que se proscreverá depois da barba?
Apesar do claro exagero que as autoridades francesas estão prestes a
cometer, a discussão em torno de
símbolos religiosos e da laicidade da
escola pública não é de modo algum
sem propósito. Faz sentido o objetivo das autoridades francesas de integrar todos os cidadãos franceses,
muçulmanos e não-muçulmanos,
ao secularismo laico e republicano.
Só que, num Estado democrático,
metas como essa não deveriam ser
impostas de modo compulsório.
O problema da lei da laicidade, que
bane, além do véu das muçulmanas,
grandes crucifixos, o quipá (solidéu)
dos judeus e o turbante dos sikhs, é
que ela incorre numa violência maior
do que o mal que se pretendia combater. Como bem observou Ferry,
acuados, os muçulmanos podem escolher outros símbolos, como a barba, para exprimir sua identidade.
A escola pública deve, sem dúvida,
ser laica, e a integração secular é um
valor a perseguir. Só que essas metas
não podem ser buscadas com o sacrifício da mais elementar das liberdades individuais, que é a de possuir
uma individualidade e exprimi-la de
forma pacífica.
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