São Paulo, sábado, 26 de janeiro de 2008

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SÉRGIO MALBERGIER

A mão invisível

EM MENOS de um século, o sistema capitalista gerou forças mais colossais do que todas as gerações precedentes combinadas.
A afirmação é de Karl Marx e Friederich Engels, no jurássico "Manifesto Comunista", de 1848.
160 anos depois, o sistema combatido pela dupla alemã segue gerando forças colossais, como prova a emergência de China, Índia e Brasil, países que estão tirando milhões de pessoas da pobreza com mais capitalismo, não menos.
Mas o regime vive agora outra de suas crises cíclicas, parida num caldo explosivo de crédito farto e barato, avanços na engenharia financeira e grandes reservas de capital de países asiáticos e petroleiros.
Essa frouxidão monetária reanimou a economia global, mas encontrou na nova geração de financistas high-techs um sopro potente que inflou os ativos. Quase todos os índices e preços levitaram perto de suas máximas altistas ao longo de 2007, içados pela sofisticação financeira contagiosa de contratos futuros, derivativos, SIVs, CDOs...
A multiplicação das siglas atraiu investidores a um mercado global sem barreiras, veloz, onde tudo é precificável e negociável em qualquer intervalo de tempo, a qualquer momento. A sofisticação dos mecanismos financeiros é tanta que os governos perderam a capacidade de avaliá-los e segurá-los.
Essa responsabilidade essencial foi repassada aos próprios mecanismos de controle de risco dos bancos e às agências de classificação de risco. Mas os riscos foram mal compreendidos, mal calculados ou simplesmente ignorados em busca do ganho máximo.
A mão invisível do mercado agora pune quem se excedeu, enquanto a mão visível de bancos centrais e governos socorre o sistema.
E se inovações financeiras historicamente trouxeram explosão de preços seguida de crise e queda, esta crise tem uma novidade importante: países emergentes como o Brasil estão muito mais sólidos, com reservas trilionárias e empresas capitalizadas, prontos a assumir maior papel na dinâmica global. É esse dinheiro dos "pobres" que hoje reaviva os "ricos", comprando nacos cada vez maiores de empresas como Citigroup e UBS.
O Brasil tem a chance de sair bem dessa crise, com reservas de US$ 185 bilhões, política monetária conservadora, política fiscal menos irresponsável, empresas lucrativas, bancos fortes, mercado interno vultoso. E produção agropecuária recorde -dos poucos setores que podem manter cotações nessa reprecificação geral para baixo, graças à revolução alimentar na Ásia e aos biocombustíveis.
Instalado o tumulto econômico, lideranças globais já debatem maneiras de aperfeiçoar o sistema para torná-lo mais seguro e justo. E assim avançamos, com a impressão de que o capitalismo é o pior regime econômico já inventado, com a exceção de todos os outros que foram tentados até aqui.


SÉRGIO MALBERGIER é editor de Dinheiro .


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