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Premiar o trabalho
Expansão de gasto social foi um ato democrático, mas criou distorções fiscais e de paradigmas que devem ser corrigidas
O RETORNO à democracia, marcado pela promulgação da Carta de
1988, inaugurou um
novo capítulo na história das políticas públicas brasileiras. Desde então proliferam, nas três esferas de governo, programas destinados a elevar o poder de compra dos mais pobres mediante
intervenção direta do Estado.
No âmbito federal, integram o
núcleo desse acervo a Previdência Rural, a Lei Orgânica da Assistência Social, a vinculação do
piso das aposentadorias ao salário mínimo -e a política de aumento acelerado de seu valor-,
bem como as ações de transferência de renda hoje reunidas no
Bolsa Família. O espírito do pacto democrático, num país cindido por drástica desigualdade, explica e justifica a opção tomada.
A expansão desordenada desses programas sociais e a necessidade de ampliar a margem de
políticas que promovam o emprego, no entanto, exigem revisão de procedimentos. Os princípios de justiça social, recompensa pelo esforço individual e equilíbrio das finanças públicas precisam ser harmonizados.
Como mostrou ontem reportagem da Folha, a aposentadoria
especial do setor rural contém
mecanismos de desestímulo à
atividade profissional. Um lavrador com um dia de trabalho registrado na carteira tem de esperar até os 65 anos para aposentar-se. Se não tiver registro nenhum, ganha direito a um salário
mínimo por mês ao completar
60. Muitos trabalhadores, obviamente, fogem do emprego formal para não perder o privilégio.
O governo pretende corrigir
essa irracionalidade com um
projeto de lei que garante os benefícios da aposentadoria rural
mesmo quando o trabalhador tiver até 120 dias de trabalho por
ano assinalados na carteira profissional. Resposta tímida, pois
combate só os efeitos derivados
da distorção maior que é tratar
como assunto previdenciário o
que é política assistencial.
No setor rural, para cada R$ 10
despendidos pelo INSS, o governo recebe R$ 1,20 em contribuições de futuros segurados. No
segmento urbano, a receita para
os mesmos R$ 10 de gasto é de
R$ 9. À diferença do primeiro,
este é um programa previdenciário, em que o trabalhador remunera o governo por décadas a
fim de receber uma quantia
mensal, após aposentar-se, proporcional à sua contribuição.
Para estimular o trabalho formal, o sistema não pode continuar operando no molde atual. O
trabalhador rural deveria buscar
o emprego com registro na expectativa de ampliar direitos e
rendimentos não apenas no presente mas também após a aposentadoria. Pagar os mesmos R$
350 a quem contribuiu e a quem
nunca o fez é oferecer um bônus
à informalidade e à inatividade.
Políticas assistenciais, como as
aposentadorias rurais, deveriam
ser desvinculadas da Previdência e do salário mínimo e incorporadas ao Bolsa Família. A fusão permitiria aumentar o valor
do auxílio aos mais pobres, bem
como o total de beneficiários
-com uma aposentadoria rural
é possível custear cinco estipêndios do programa federal de renda mínima. O sistema ganharia
em justiça e sustentabilidade.
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