São Paulo, segunda-feira, 26 de fevereiro de 2007

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Saúde: primo rico e primo pobre

CARLOS FREDERICO DANTAS ANJOS


Vale lembrar que desde 2003 o Instituto de Infectologia Emílio Ribas se debate com problemas econômico-financeiros


NO FINAL do ano passado, acompanhamos pela imprensa notícias sobre duas importantes instituições públicas de saúde enfrentando problemas administrativos, financeiros e de modelo de gerenciamento. Refiro-me ao Instituto do Coração (InCor) e ao Instituto de Infectologia Emílio Ribas (IIER).
Tradicionais hospitais públicos de renomado prestígio junto à sociedade em suas respectivas áreas de atuação, o InCor e o IIER vivem uma crise que tem nos seus modelos de administração e gestão econômico-financeira os determinantes maiores de suas atuais dificuldades.
Com um orçamento significativo, por meio de recursos provenientes do Tesouro estadual e/ou dos recursos advindos da Fundação Zerbini, o modelo de fundação adotado pelo InCor enfrenta problemas a demandar soluções em curto prazo que o viabilizem econômico-financeiramente.
Prontamente, os governos federal e estadual, por meio da Secretaria da Saúde, criaram um grupo de trabalho emergencial para a busca de soluções imediatas para superar as dificuldades financeiras e administrativas vividas por essa respeitável e renomada instituição pública de assistência, ensino e pesquisa na área de doenças cardiovasculares.
Em 4/12/06, o sr. governador do Estado envia à Assembléia Legislativa o PLC nš 79/2006, que transforma o Hospital das Clínicas (HC-FMUSP) em autarquia de regime especial, suplementando o quadro de pessoal do InCor "em função da grave crise econômico-financeira por que passa a Fundação Zerbini", como justifica o sr. secretário da Saúde.
Queremos chamar a atenção para a política de primo rico e primo pobre com que a Secretaria da Saúde, diferenciadamente, trata duas tradicionais instituições públicas de saúde pertencentes ao Estado, geograficamente próximas e integrando o chamado quarteirão público da saúde na avenida Dr. Arnaldo.
Em 1/12/2006, por ocasião do Dia Internacional de Luta contra a Aids, o corpo clínico do Emílio Ribas volta a se manifestar publicamente reclamando mudanças administrativas e melhorias nas condições de atendimento na instituição.
Vale lembrar que desde 2003 o Emílio Ribas vem se debatendo com problemas econômico-financeiros, administrativos e de modelo de administração. Naquele ano, o corpo clínico do IIER elaborou um relatório, apresentado ao secretário da Saúde, sr. Luiz Roberto Barradas Barata, contendo amplo diagnóstico institucional e propostas de mudanças com o objetivo de transformar o atual modelo e criar mecanismos mais rápidos e eficientes de gestão.
São problemas crônicos que, aliados à falta de recursos e à centralização administrativa excessiva, levam à deterioração da relação do corpo clínico com a direção, das condições de trabalho e de atendimento.
Contribui para isso a falta de diálogo por parte do gestor estadual, que, diferentemente da solução encontrada para o InCor, nunca teve uma só palavra sobre o papel do IIER na política estadual de saúde. Todas as ações relativas ao IIER, se é que existem, são definidas de fora para dentro, de forma extremamente centralizada e sem a menor participação do corpo clínico do hospital.
São exemplos a tentativa de incorporação do IIER na malfadada Agência de Controle de Doenças e Promoção de Saúde e, em seguida, a desvinculação do IIER da Coordenação dos Institutos de Pesquisas (CIP), descaracterizando o IIER como hospital de referência, ensino, pesquisa e assistência de média e alta complexidade em doenças infecciosas.
Lamentamos que, como no passado, ainda ocorram redução de valores orçamentários e grande variabilidade de recursos ano a ano, que são insuficientes para atender as metas e atividades estabelecidas na proposta orçamentária e para a manutenção e a ampliação dos serviços e equipamentos.
É importante que haja a garantia de uma maior dotação orçamentária para o IIER e que o corpo clínico possa participar da sua elaboração e da definição de suas prioridades.
O resgate histórico do papel do IIER no campo da saúde pública e das doenças infecciosas em nosso país é o maior legado institucional, e sua valorização pelas autoridades públicas de saúde estadual e federal, um compromisso com a população.
Nesse sentido, à semelhança do que ocorreu com o InCor, seria importante que o novo governo do Estado, por meio da Secretaria da Saúde, estabelecesse, de imediato, um fórum de discussão ou grupo de trabalho para, com o corpo clínico e a direção do IIER, elaborar uma proposta de novo modelo administrativo para o Instituto de Infectologia Emílio Ribas, com maior autonomia administrativa e financeira.

CARLOS FREDERICO DANTAS ANJOS , 51, é diretor clínico do Instituto de Infectologia Emílio Ribas.


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