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CLÓVIS ROSSI
Fome mil
SÃO PAULO - Bem de acordo com
os tempos modernos, todas as energias, no mundo todo, estão voltadas
para decifrar as conseqüências da
turbulência financeira desatada pela crise das hipotecas nos Estados
Unidos.
Enquanto isso, no mundo real -e
nas áreas pobres-, está em andamento uma crise muito mais devastadora, na forma da falta de alimentos para os que vivem da caridade
internacional.
O alerta foi dado pelo Programa
Mundial de Alimentos da ONU e recolhido na edição de ontem do "Financial Times". Segundo Josette
Sheeran, diretora-executiva, ou se
corta o tamanho da comida fornecida aos pobres, ou se corta o número
de beneficiários.
Tudo por conta da disparada dos
preços da alimentação, fenômeno
que, aliás, não tem fronteiras nem
poupa classes sociais menos desfavorecidas. Sheeran chega a dizer
que está surgindo "uma nova face
da fome", com mais pessoas à margem do mercado de consumo de comida por causa dos preços.
Pudera: na China, a inflação de janeiro (7%) foi a mais alta em 11 anos
-e se deve, em grande medida, aos
custos adicionais dos alimentos. Na
Itália, que está longe de ser um país
pobre, o pão aumentou 12,5% em
um ano, enquanto as massas tiveram alta de 10%.
Mas o grande problema está mesmo nos países pobres, que terão que
pagar 35% a mais para importar cereais, elevando a conta total para
US$ 33 bilhões no ano até julho, todo um recorde.
Para o Brasil, a situação tem uma
dupla face: permite exportar alimentos a preços mais altos, mas
tais preços também se tornam um
problema (já são o dobro da inflação geral). Para não falar na solidariedade com os pobres, que deveria
levar o país a ajudar a enfrentar a
"nova face da fome", idéia que desce
mal em amplos setores de um país
que está longe de ter gordura para
queimar.
crossi@uol.com.br
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