São Paulo, quinta-feira, 26 de fevereiro de 2009

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CARLOS HEITOR CONY

Nó de cachorro

RIO DE JANEIRO - A cada desfile no sambódromo, lembro sempre um conto de Marques Rebelo, que anda um pouco esquecido, mas que pegou com sucesso o veio carioca do romance nacional, iniciado com Manuel Antônio de Almeida ("Memórias de um Sargento de Milícias"), Machado de Assis e Lima Barreto.
O conto traz a história do prefeito que decide incrementar o turismo em sua cidade do interior. Gasta todo o orçamento municipal na construção de um luxuoso palanque, cheio de camarotes, aluga uma frota de ônibus e traz uma porção de turistas na maior boca livre da região.
O palanque ficou cheio, bebidas e salgadinhos à farta. Que foi um sucesso, foi. Toda a cidade -e todo o povo das vilas vizinhas- desfilaram durante três dias diante do palanque para apreciar os turistas bebendo e comendo à custa das burras municipais. Gente que nunca tinha visto um turista, nem sabia ao certo o que era e o que fazia um turista, deslumbraram-se com o surto de civilização e progresso que o prefeito trazia à cidade.
O Rio não chega a ser uma cidade do interior, mas às vezes parece. Sua máxima festa está começando a lembrar a concentração de turistas nos diversos palanques armados pelas autoridades e exaltados pela mídia. Pouco a pouco, o pessoal que desfila na passarela ocupa um lugar privilegiado para assistir a turma que ocupa os camarotes do sambódromo, onde correu até mesmo uma beberagem que o presidente Lula tomou, feita de uma erva conhecida como "nó de cachorro", e que tem a desvantagem de não ser alcoólica.
Há razão para tudo. Os desfiles estão cada vez mais complicados, é difícil entender aquilo tudo, alegorias, enredos, propostas, homenagens a isso ou aquilo. Nos camarotes, a coisa corre mais fácil e, até certo ponto, mais divertida.


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