São Paulo, quinta-feira, 26 de fevereiro de 2009

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TENDÊNCIAS/DEBATES

Arma contra a crise

LAIR KRÄHENBÜHL


Dinamizar a construção de moradias (populares ou não) que dependem do custo dos financiamentos passa pela redução da taxa de juros

O CHAMADO pacote habitacional federal, a ser anunciado, é positivo e torcemos para que seja realista e abrangente. Algo foi feito nos últimos seis anos para estimular a construção civil, mas em ritmo e intensidade insuficientes. Em vez de cobrar o que não foi feito, queremos contribuir para transformar a habitação de interesse social em teto para a população de baixa renda e, ao mesmo tempo, em casamata que atenue o efeito da crise -que já atinge a economia, o emprego e os trabalhadores. E não pode ser enfrentada só com discursos, marketing e boas intenções.
Poucos setores absorvem mão-de-obra como o da construção civil, o segundo maior empregador do país, atrás apenas do agrícola. A construção de 100 mil moradias criaria, no mínimo, 150 mil empregos.
Mas dinamizar a construção de moradias (populares ou não) que dependem da oferta e do custo dos financiamentos passa pela redução da taxa de juros, decisão que cabe ao governo federal. Nenhum pacote habitacional verdadeiro pode prescindir de uma mudança substancial nessa orientação em relação aos juros. Do contrário, não haverá mutuários capazes de pagar prestações ou dinheiro público suficiente para subsidiar as centenas de milhares, como antecipa a pré-propaganda, de moradias para a população de baixa renda (e mesmo para a de renda mais elevada).
Sendo insuficientes os recursos públicos, é preciso atrair investimentos privados. Desde o início da administração, temos procurado o setor privado, que provê fundos para a construção civil e para o financiamento dos mutuários. O setor público deve utilizá-los a fim de viabilizar as operações de três formas: em subsídios repassados aos compradores de baixa renda, no preço do imóvel ou nos custos do financiamento.
Para isso criamos o Fundo Paulista de Habitação de Interesse Social e o Fundo Garantidor Habitacional -que o governo federal agora parece inclinado também a implantar. Esses fundos processam os subsídios aos mutuários e reduzem o risco dos empreendedores privados. Ao incorporarem os agentes financeiros e o setor privado de habitação, ambos permitirão alavancar em mais de três vezes o impacto dos recursos aplicados no segmento de mutuários de até cinco salários mínimos, em que se concentra o déficit de moradias.
Boa parte dos recursos paulistas para o setor habitacional tem sido dirigida à urbanização de favelas -prioridade para o governo de São Paulo. Essas intervenções exigem ações bem planejadas e integração de esforços para gerar transformações importantes após implantação de infraestrutura, drenagem e sistema viário e erradicação de ocupação em áreas de risco ou proteção ambiental.
A manutenção da população local, com a melhoria e a regularização das moradias, cria verdadeiros bairros. A urbanização de favelas é um modelo inteligente que pode e deve ser ampliado. Há também que se estudar a viabilização de linhas de crédito para a aquisição de lotes urbanizados.
O equacionamento do problema habitacional, no entanto, é inseparável da solução para a ocupação irregular do solo. Por isso estamos in-vestindo na promoção da regularização fundiária e criamos o Programa Cidade Legal, que apoia e orienta os municípios. Cerca de 800 mil famílias paulistas vão ser beneficiadas na primeira fase -e milhões poderiam vir a sê-lo em todo o país.
A obtenção da propriedade legal possibilita conquistas como crédito, ingresso formal na economia, liquidez do bem e transmissão por herança. Para começar, reduzimos em até 90% o custo dos serviços notariais e de registro de imóveis que integram os programas de regularização. Com a lei estadual aprovada em 2008, o custo médio para registro de um imóvel caiu de R$ 2.317,33 para R$ 192,60. O governo estadual está investindo na capacitação de técnicos dos municípios conveniados para que criem estruturas, legislação e procedimentos de suporte ao programa.
Espera-se que o pacote federal determine, por exemplo, que o governo conceda recursos a fundo perdido para subsidiar prestações. A redução do valor do financiamento ao mutuário potencializaria a ação de fundos que já existem ou que venham a existir, com essa finalidade, em todos os Estados. O governo federal poderia também liberar a operacionalização dos recursos do FGTS para agentes financeiros que não a Caixa Econômica Federal. Por último, é importante lembrar que destinar recursos orçamentários estáveis e permanentes, a exemplo do que é feito em São Paulo com a destinação de percentual do ICMS, colabora no combate de longa duração que o déficit nacional da habitação exige.


LAIR KRÄHENBÜHL é secretário da Habitação do Estado de São Paulo e presidente da CDHU (Companhia de Desenvolvimento Habitacional e Urbano).

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