São Paulo, Sexta-feira, 26 de Fevereiro de 1999
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Os governadores e o pacto de hoje


O encontro na Granja do Torto deve, pela sua importância histórica, extrapolar o tema fiscal e contemplar o social


RAUL JUNGMANN

A reunião de hoje em Brasília entre os governadores dos Estados e o presidente da República concentra as atenções da nação -políticos, trabalhadores, empresários, imprensa. Os brasileiros todos estão convencidos da importância desse fórum como uma oportunidade única de discutir, propor e adotar, a curto prazo, medidas que afetem positivamente a vida da população.
O presidente e os governadores levarão a força e a representatividade recentemente adquiridas nas urnas. Isso é fundamental para respaldar as propostas e garantir o clima de respeito e harmonia que o país espera ver confirmado ao longo da reunião (e nos dias seguintes).
É necessário, no entanto, que a agenda do encontro não seja monopolizada pela questão fiscal. Não se discute que os Estados vivem dificuldades financeiras. Mas também não se discute que os novos governadores precisam honrar os compromissos assumidos na renegociação das dívidas, embora a maioria tenha encontrado um quadro preocupante, que estreita suas legítimas ambições administrativas e inviabiliza muitas das propostas assumidas em praça pública há poucos meses.
Tudo isso está fora de discussão. O que precisa ser lembrado hoje é que o encontro na Granja do Torto deve, pela sua importância histórica, extrapolar o tema fiscal e contemplar o social. Os governadores encontrarão um presidente preocupado com a questão dos empregos e pronto a aceitar parcerias que aprofundem programas capazes de gerá-los -como a reforma agrária.
A reforma agrária é hoje um assunto aceito sem divergências no Brasil. Por isso, pode avançar, gerando empregos no campo, produzindo vagas a um custo muito mais baixo do que nas cidades. E esse avanço pode se dar rapidamente, desde que haja um mutirão envolvendo os governos da União, dos Estados e dos municípios, trabalhadores, movimentos sociais, igrejas -enfim, a sociedade como um todo.
Temos, como outro exemplo, a questão da pesca, que pode gerar milhares de empregos imediatamente, com programas ligados ou não à reforma agrária, ao Ministério da Agricultura, ao BNDES, em associação com os Estados.
O Banco da Terra -que enseja a possibilidade de comprar terras no mercado, com prazos dilatados de financiamento, para nelas instalar agricultores- pode ser um fator imediato de geração de emprego e renda. Ainda mais agora, quando a agricultura brasileira, após as mudanças cambiais, passou a ser mais competitiva.
Há assentamentos da reforma agrária que exportam boa parte de sua produção. Não são a maioria e estão muito acima da média de qualidade e eficiência. Mas podemos multiplicar esses exemplos se houver uma parceria efetiva entre os governos federal, estaduais e municipais, cooperativas e associações de trabalhadores rurais, numa mobilização nacional para gerar empregos no campo e reforçar a agricultura familiar -independentemente de outros esforços que estão sendo feitos noutras áreas, como a redução do IPI para a indústria automobilística, que o presidente acaba de autorizar.
Com o respeito que evidentemente merecem os homens que governam e representam seus Estados, graças à vontade do povo, gostaríamos de a eles nos dirigir neste instante, apenas para lembrar: não vamos perder essa oportunidade e apequenar uma reunião histórica tratando exclusivamente de questões financeiras. A reunião da Granja do Torto pode -e, sobretudo, deve- ser muito maior do que isso.


Raul Jungmann, 46, é ministro extraordinário de Política Fundiária. Foi presidente do Ibama (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis) de 1995 a 1996.



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