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Prévias secretas
Ao impor regras em excesso, normatização eleitoral restringe a autonomia partidária e sufoca o debate político
EMARANHA-SE numa legislação burocrática e irrealista a proposta de se realizarem prévias partidárias para a escolha de candidatos
em 2010. O Tribunal Superior
Eleitoral, atendendo a uma consulta do PSDB, decidiu nesta terça-feira que esse tipo de mecanismo, sem dúvida desejável e
democrático, não está proibido
pelas normas em vigor.
Não está proibido, mas submete-se a empecilhos e condicionantes dos mais bizarros. Na verdade, já constituiria motivo suficiente de estranheza o fato de se
considerar necessário o aval dos
tribunais para uma questão que
diz respeito exclusivamente à vida interna dos partidos políticos.
Reconhecendo esse princípio,
o TSE considerou que a decisão
de realizar prévias pertence à alçada interna de cada partido. As
dificuldades, entretanto, surgem
logo a seguir.
Como se dará a disputa entre
os pré-candidatos da legenda?
Quem acompanhou a disputa interna no Partido Democrático
nos Estados Unidos pôde verificar a grande liberdade dos debates, e a extrema variedade dos
mecanismos de consulta utilizados, até chegar-se ao nome de
Barack Obama como candidato
oficial à Presidência.
Nada de semelhante poderá
ocorrer no Brasil, pelo que foi decidido no TSE. A corte lembra
que as postulações dos pré-candidatos não podem dar margem
ao que considera "propaganda
eleitoral antecipada".
Desse modo, nenhum postulante poderá apresentar suas
propostas na internet. Argumenta-se que, com isso, não apenas
os filiados de uma agremiação,
mas todo o eleitorado, estaria
sendo exposto antecipadamente
à propaganda política.
Ao mesmo tempo, permite-se
que os pré-candidatos enviem e-mails aos seus companheiros de
partido. Imagine-se, por hipótese, que o e-mail seja repassado a
quem não pertence à sigla. Seria
o caso de punir os responsáveis
pela propaganda irregular?
Uma blindagem impraticável e
antidemocrática circunscreve,
então, uma disputa política de
evidente interesse para todo o
eleitorado. Tudo se resume, na
verdade, ao irrealismo de uma lei
eleitoral que estabelece, com dia
marcado, o início oficial da campanha dos candidatos.
"A propaganda eleitoral", diz o
artigo 36 da Lei 9504/97, "somente é permitida após o dia 5
de julho do ano da eleição".
Em tese, a data indicaria o início das restrições destinadas a
garantir um mínimo de paridade
de condições e de ordenação jurídica na disputa. O dispositivo,
entretanto, funciona retroativamente -e a data termina sendo
tomada como um momento mágico, uma espécie de "fiat lux" da
vida política. Antes de 5 de julho,
tudo que possa parecer campanha se proíbe.
Mas o debate político, ainda
mais quando facilitado por mecanismos como a internet, foge a
parâmetros burocráticos desse
tipo; e a prática das prévias, assim como a autonomia interna
dos partidos, sofre com isso restrições que nada mais fazem senão sufocar o pleno desenvolvimento político do país.
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