São Paulo, sábado, 26 de março de 2011

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Desordem europeia

Risco de insolvência portuguesa renova temor de que toda a "periferia" da região, como Grécia e Irlanda, precise de um novo socorro

A Europa está outra vez em tumulto, agora devido ao risco de o governo de Portugal tornar-se incapaz de refinanciar suas dívidas.
Nem mesmo há um governo português, pois o premiê socialista José Sócrates renunciou. O Parlamento rejeitou o plano de contenção de despesas que, segundo Sócrates, permitiria ao país honrar débitos sem o socorro e a intervenção branca da União Europeia.
A questão portuguesa não difere das desordens semelhantes provocadas por dificuldades econômicas dos demais países da "periferia europeia", em particular Grécia e Irlanda. Trata-se de um conflito desencadeado pelo debate a respeito de quem pagará a conta do colapso econômico.
Os governos e o setor privado desses países amontoaram grandes dívidas, débitos que não financiaram incrementos de produção nem de produtividade. Acumularam também deficits externos: consumiram mais bens e serviços adquiridos no exterior do que os exportaram.
Suas economias não crescem nem são competitivas o bastante para bancar tais dívidas e deficits. São países que viveram acima de seus meios, financiando-se a custo baixo ao adotarem o euro como moeda e viverem sob a guarida do Banco Central Europeu.
As despesas provocadas pela grande crise de 2008 deram cabo desse ciclo de endividamento, que parecia sem fim. Os credores passaram a cobrar juros mais elevados para financiar a dívida. Demandam, ainda, demonstrações de capacidade de pagamento. Isto é, redução dos gastos governamentais, com o decorrente corte de benefícios sociais, e medidas que elevem a produtividade.
O aumento da competitividade implica, entre outras medidas corretivas, a repressão de salários no setor público e privado. Enfim, consumo menor e redução dos padrões de vida, o que acarreta resistência política. A baixa geral do consumo provoca recessões, e assim se reduz, a princípio, a capacidade de pagamento dos países. Trata-se de um círculo vicioso.
A eventual insolvência dos governos afetaria o sistema bancário europeu, o que pode exigir mais aportes de capital público ao setor financeiro. Como adendo a essa nuvem de riscos, desconhece-se a solidez da banca europeia. Em 2010, as autoridades atestaram sua saúde, e logo em seguida quebraram os bancos irlandeses.
A questão essencial é a responsabilidade pelo custo do ajuste. Apenas recessão e sacrifício do nível de vida nos países "periféricos" não devem ser o bastante para gerar a receita necessária.
Não é provável, assim, que essas nações consigam reerguer-se sem uma redução da dívida, um calote limitado organizado que repartisse os custos entre governos (e cidadãos) de países mais ricos e o setor financeiro. Parece a solução mais sensata.


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