São Paulo, quarta-feira, 26 de abril de 2006

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ANTONIO DELFIM NETTO

A mãe de todas as reformas

A despeito da garantia do senhor presidente da República e de seu ilustre ministro da Fazenda de que o superávit primário nos próximos anos será de 4,25% do PIB, e de que isso será suficiente para assegurar uma redução lenta, mas contínua, da relação dívida líquida/PIB, o "mercado" revela uma desconfiança crescente a respeito desse resultado. A primeira razão reside na clara divergência entre a relação dívida líquida/PIB e a dívida bruta/PIB. A segunda passou de 71,4%, em 2002, para 74,8%, em 2005, enquanto a primeira caiu de 55,5% para 51,6% no mesmo período. O movimento é explicável, mas coloca dúvidas sobre a qualidade da relação dívida líquida/PIB para resumir a situação fiscal. Como o Brasil é um dos poucos países que utilizam essa estatística, os olhos do "mercado" se voltam para a relação dívida bruta/PIB, que é usada universalmente.
A segunda é um problema mais sério e refere-se à velocidade com que as contas do INSS estão deteriorando a situação fiscal. A tabela abaixo mostra a receita e a despesa do INSS em porcentagem do PIB de 2002 a 2005.



O fato perturbador nessa tabela é que, enquanto a receita cresceu a uma taxa de 2% ao ano em relação ao PIB, a despesa cresceu 4,9%! O desequilíbrio, que já era sério no final do governo FHC, acentuou-se dramaticamente no governo Lula. A razão, basicamente, é a pouca atenção que tem sido dada às conseqüências dos aumentos voluntaristas do salário mínimo real no período e da sua ampliação para todos os aposentados. O efeito é tanto mais grave quanto mais o salário mínimo se aproxima do salário médio e quanto maior for a velocidade do aumento da população com mais de 60 anos em relação aos que podem e estão trabalhando de 14 a 60 anos.
A gravidade da situação pode ser apreciada na tabela abaixo, onde comparamos apenas 2002 contra 2005:


O aumento do superávit primário foi menor do que o aumento da carga tributária bruta -de 34,9% para 36,5% do PIB no período.
Vemos que, do grande esforço do Tesouro e do Bacen para aumentar o superávit primário federal, o aumento do déficit previdenciário "engoliu" 57%! Se tudo continuar como está, e se a receita e a despesa do INSS evoluírem no mesmo ritmo nos próximos anos, o déficit previdenciário em 2010 será da ordem de 3,4% do PIB. Isso garante uma crise fiscal no próximo mandato, a não ser que o Tesouro e o Bacen garantam um superávit primário da ordem de 6% do PIB!
Há, assim, alguma razão para uma certa inquietação do "mercado". A primeira tarefa, portanto, de quem for eleito em 2006 é apresentar um projeto da "mãe de todas as reformas" que necessitamos: a reforma da Previdência Social. E aprová-lo!

Antonio Delfim Netto escrve às quartas-feiras nesta coluna.
@ - dep.delfimnetto@camara.gov.br


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