São Paulo, domingo, 26 de julho de 2009

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Editoriais

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Recuperar o centro

Para revitalizar a região central, é preciso que o poder público conquiste a confiança da iniciativa privada e da população

A CHAMADA cracolândia existe há cerca de 20 anos na região central de São Paulo. Tem nome, endereço e alguma notoriedade, ao contrário daquela parcela de seus ocupantes, que, desumanizada e em bandos, consome e comercializa crack a céu aberto. O poder público ajudou a moldar esse triste espetáculo urbano ao omitir-se ou restringir sua atuação a medidas esporádicas e ineficazes.
A situação foi tolerada até que se tornasse de difícil solução. Agora, prefeitura e Estado montam uma operação interdisciplinar na tentativa de enfrentar a questão de modo adequado. Além das ações policiais, incumbiram agentes de saúde de persuadir dependentes a deixar a rua e buscar tratamento médico.
Não é tarefa fácil. Há que se dar tempo ao tempo para colher resultados -e para tanto é fundamental perseverar. Seria um desastre se mais uma vez as autoridades patrocinassem uma "solução" espalhafatosa e inconsequente para o problema.
A cracolândia é um dos aspectos que assombram o processo de revitalização do centro de São Paulo. A degradação dessa área de cerca de 30 quadras no bairro de Santa Efigênia é uma espécie de atestado da incapacidade da administração pública de garantir as condições necessárias para levar investimentos à região, em especial aqueles que possam atrair moradores.
Embora importantes, os equipamentos culturais que continuam sendo criados em bairros centrais não bastam para assegurar seu renascimento. Da mesma forma, a transferência de unidades públicas, como a aventada mudança da sede do governo estadual para o palácio dos Campos Elíseos, será insuficiente caso não venha acompanhada de uma política de estímulo à habitação. Este é um aspecto crucial.
Para que empresários sintam-se incentivados a investir e habitantes da cidade se inclinem a morar no centro é indispensável remover entraves à construção e à reforma de edifícios, recuperar o espaço público e promover a segurança e a limpeza.
Mais do que isso, é preciso que as autoridades emitam sinais inequívocos de que há um projeto de longo prazo, um planejamento sólido, com regras e procedimentos capazes de sobreviver às mudanças políticas.
Não é o que se tem verificado nos últimos anos. Mesmo numa única gestão, uma simples mudança de secretários ocasiona perda de continuidade. É essencial que haja coordenação entre os diversos órgãos e clareza sobre quem coordena o processo. É imperioso substituir o receio e as incertezas dos paulistanos pela confiança na revitalização.
Nesse sentido, será preciso avaliar até que ponto irá funcionar o dispositivo de concessão urbanística escolhido pelo prefeito Gilberto Kassab para a reforma da chamada Nova Luz -nome escolhido para rebatizar a cracolândia. Como se anuncia, o poder municipal irá transferir uma área para empresas ou consórcios, que terão o direito de desapropriar terrenos para erguer seus projetos.
A dúvida é se tal mecanismo conseguirá despertar interesse ou se o temor quanto a problemas burocráticos e judiciais continuará a impedir que os investimentos privados cheguem ao centro da cidade.


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