São Paulo, quinta-feira, 26 de setembro de 2002

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TENDÊNCIAS/DEBATES

Argentina, Brasil e o futuro em comum

EDUARDO DUHALDE

Os anos transcorridos desde a recuperação da democracia na Argentina e no Brasil têm sido testemunhas de um aprofundamento da amizade e do relacionamento entre os dois países nunca antes alcançado.
A vizinhança, o fato de termos tudo em comum, de havermos superado definitivamente as diferenças e a condição de fazermos parte de um mesmo espaço geográfico constituem uma realidade que favoreceu o desenho de projetos ambiciosos e de longo alcance. Da mesma maneira, o fato de compartilharmos uma comunidade de valores e de princípios tem permitido que esses projetos sejam sustentáveis e que se insiram dentro de uma visão estratégica.
O Brasil representa, para a Argentina e para o seu povo, um destino comum; e os argentinos temos recebido sempre, por parte dos brasileiros, esse mesmo sentimento. As provas de amizade e de solidariedade, do governo, do Congresso e da sociedade, nestes tempos de conjuntura complexa, demonstram que esse sentimento está profundamente arraigado em um e em outro país.
A decisão de encararmos juntos o ideal da integração econômica e política, levando aos fatos esse destino comum escrito na história dos nossos povos, assentou as bases para o estabelecimento do Mercado Comum do Sul, que é uma das conquistas mais importantes que temos alcançado nesta parte do hemisfério. Hoje, apesar das dificuldades que enfrentam as nossas economias e de uma conjuntura internacional que nem sempre resulta propícia, o Mercosul é a melhor via para nos posicionarmos na construção da Alca e para alcançarmos um relacionamento proveitoso com a União Européia e outros blocos e economias de envergadura.
Longe de ser uma opção meramente comercial, o Mercosul é para a Argentina um projeto de integração muito mais amplo, que tem conquistado identidade própria; é um projeto que começa agora e que foi pensado com uma visão de longo prazo, o que o leva, necessariamente, à superação das dificuldades conjunturais e, ao mesmo tempo, a aprofundar seus aspectos políticos, econômicos e culturais.
Trabalhar com o Brasil e com os nossos sócios no Mercosul para ampliar as nossas fronteiras de integração e cooperação para toda a região da América do Sul é, também, um imperativo que nos permitirá aproveitar o potencial de uma das regiões que oferecem as melhores oportunidades de realizar bons negócios em benefício de todos os nossos países, e onde as políticas nacionais de desenvolvimento se veriam enormemente favorecidas com uma visão estratégica de conjunto, para toda a região.


Minha visita tem também um profundo conteúdo político e de reafirmação do compromisso de trabalharmos juntos


Nossos países vivem num cenário, caracterizado pela globalização e pela interdependência dos atores internacionais, que influencia de maneira particular a produção, o comércio, a movimentação de capitais e a segurança internacional. Mas, assim como esse contexto apresenta desafios e dificuldades a países emergentes como os nossos, coloca ao nosso alcance oportunidades que não devemos deixar de aproveitar.
Nossa região é uma das mais pacíficas do planeta e, apesar das crises econômicas e dos embates sofridos por nossas instituições, temos liberalizado as nossas economias; estamos consolidando com firmeza nossos sistemas democráticos, o Estado de Direito e o respeito às liberdades individuais e aos direitos humanos, e avançamos na articulação de um sistema de segurança para a região.
Esse conjunto de conquistas e de valores forma parte de uma riqueza que não se quantifica, mas que nos permite servir de exemplo para outras regiões.
Mas o fato de estarmos afastados geograficamente dos conflitos mais cruentos não nos exime de uma responsabilidade inevitável para com toda a comunidade internacional. Trata-se, sim, de uma responsabilidade que temos assumido em nossa região com absoluta clareza e rapidez, por meio de ações multilaterais concertadas e baseando-nos nas decisões emanadas dos órgãos competentes da OEA e das Nações Unidas.
É muito gratificante para um país como a Argentina saber que os princípios e valores que formam os fundamentos da sua política exterior são os mesmos que possui seu sócio estratégico na região; que nossos interesses são convergentes e que nossa projeção estratégica, como nação, apóia-se na sinergia que se logra por meio de uma relação bilateral rica e fluida.
Os projetos de infra-estrutura, bem como os marcos reguladores, o comércio, os investimentos, a utilização racional dos nossos recursos naturais e a cooperação técnica, cultural e educativa são alguns dos exemplos das áreas nas quais, somados os esforços de ambos os países, são obtidos resultados exponenciais para o benefício dos nossos povos.
Estou hoje em Brasília como presidente dos argentinos para me reunir com o presidente Fernando Henrique Cardoso, a fim de concluir os entendimentos econômicos e comerciais nos quais nossos dois governos têm estado trabalhando ao longo deste ano, instrumentos que facilitarão o financiamento do nosso comércio bilateral e o intercâmbio de produtos em áreas muito significativas para nossas economias.
Mas a visita tem também um profundo conteúdo político e de reafirmação do compromisso de trabalharmos juntos, Brasil e Argentina, em favor da integração ampla de nossos países e da região.


Eduardo Duhalde, 60, advogado, é presidente da República Argentina.



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