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ROBERTO MANGABEIRA UNGER
Nosso futuro
DIZEM versos em sânscrito,
escritos há mais de dois mil
anos: "A esperança é uma
corrente que nos amarra uns aos
outros. Maravilha de corrente. Os
acorrentados correm longe. Os desatados ficam mancos".
Nada no desalento e nas desilusões do momento nos deve fazer
esquecer que o Brasil reúne condições para ser grande país. Vasto
território, ainda pouco povoado,
com recursos hídricos e biológicos
inigualados. Facilidade para semear e para colher o ano todo. Distanciamento, inveterado e convicto, de guerras e de hegemonias. Ausência de ódios arraigados e de divisões insanáveis. Povo mais capaz
de assimilar e de misturar etnias e
culturas do que o americano, que
dessa capacidade sempre se vangloriou. Flexibilidade de espírito e
pendor para o improviso. Fé, combalida, porém ainda viva, na possibilidade de reconciliar a pujança
com a ternura.
Contra tudo isso de promissor
levantam-se três ameaças a nosso
futuro. A primeira é ensino público
incapaz de equipar a energia frustrada do país. A segunda é vida pública - e sobretudo sistema partidário - que desmoralizam ou suprimem as alternativas, de projeto
e de poder, de que precisa a nação.
A terceira é falta de identificação
de nossos quadros dirigentes com
o futuro do Brasil. Por conta dessa
falta, ainda não se consolidou entre
nós o desejo de lutar para afirmar,
dentro da humanidade, nossa originalidade coletiva e para transmitir mensagem que seja universal
justamente por ser singular.
Não começaremos a aproveitar
aquele potencial e a superar estas
ameaças se continuarmos, depois
da eleição, as rivalidades e as confusões de antes da eleição. Também não o faremos pelo caminho
de governo de união nacional que
sacrifique a consenso gelatinoso e
conservador a dialética de idéias e a
inovação de rumo vitais ao país.
Todos nós que queremos construir o desenvolvimento com inclusão e tirar a política da sombra
corruptora do dinheiro precisamos
nos unir. Lutar para que o novo governo, que, por veredicto da maioria pobre, será o do presidente reeleito, atue como agente desse projeto. E providenciar, junto com a
mudança nas regras da política, o
instrumento partidário adequado.
Para que o Brasil mude de rumo, o
presidente terá de ousar. Alguns de
seus adversários de ontem terão de
ser seus aliados de amanhã. O debate nacional terá de contar com
mais, não menos, contraste de posições. E a nação toda terá de encontrar dentro de si os recursos, de
magnanimidade e de clarividência,
necessários a seu engrandecimento.
www.law.harvard.edu/unger
ROBERTO MANGABEIRA UNGER escreve às terças-feiras nesta coluna.
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