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Ambiente de conflito
Celeuma no governo sobre obras na Amazônia pode contaminar
plano de modernização fundiária já em exame
O
DESCONCERTO entre a
banda desenvolvimentista e a ambiental no
governo Lula não corre risco de extinção. Saiu Marina
Silva do Meio Ambiente, entrou
Carlos Minc, e o conflito prossegue. Agora, em torno da rodovia
BR-319 (Manaus-Porto Velho).
A estrada, parte da malha projetada pelos militares para integrar a Amazônia, existe há três
décadas. A pavimentação e a recuperação de 711 km de seus 859
km foram incluídas no PAC, com
dotação de R$ 697 milhões.
Minc suspendeu o licenciamento do projeto por dois meses. Apreensivo talvez com a divulgação próxima da nova taxa
de desmatamento, que deverá
apontar reversão nas quedas dos
três últimos anos, pode ter julgado oportuno antecipar-se com
alguma medida de repercussão.
Há, de todo modo, razões para
temer pelo impacto ambiental
da obra. Rodovias amazônicas
induzem desmatamento de uma
faixa de até 30 km em ambas as
margens. No trajeto da BR-319
está uma das maiores concentrações de biodiversidade da Amazônia brasileira. O governador
do Amazonas, Eduardo Braga, já
defendeu que se construa ali
uma ferrovia, menos agressiva.
Se o dano potencial é tão óbvio,
por que a obra foi incluída nas
prioridades do PAC? Por conta
da péssima articulação entre as
pastas no governo federal.
Não se trata de optar entre desenvolvimento ou ambiente,
uma dicotomia ultrapassada,
mas de conciliá-los. A liderança
de tal esforço cabe ao presidente
da República, mas Lula costuma
deixar que ministros se engalfinhem e se desgastem.
O desgaste poderá, doravante,
abranger também outros ministérios, com incipiente envolvimento na solução dos impasses
regionais. Entre eles já foi identificado como mais grave e urgente a regularização fundiária.
Se Lula não mudar o estilo,
correrá risco de soçobrar no tiroteio palaciano a proposta, em estudo, de criar um rito sumário
para titular pequenas posses em
terras da União. A idéia é dispensar a regularização de áreas entre
200 e 400 hectares da vistoria e
do pagamento do valor de mercado hoje previstos em lei.
Seguindo o rito legal de hoje,
tal processo consumiria décadas.
Simplificá-lo abreviaria a insegurança jurídica de 284 mil pequenos posseiros amazônicos,
cujas terras cobrem, em média,
meros 74 hectares. Não faltará,
no governo e fora dele, quem enxergue só o custo aparente desse
projeto de benefício social -ou,
pior, quem defenda que a benevolência se estenda a posses
maiores, e sem licitação.
Regularizar em rito sumário a
posse fundiária de milhares de
famílias é o preço a pagar para
dar fim a um dos maiores entraves ao desenvolvimento equilibrado da Amazônia.
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