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São Paulo, domingo, 26 de outubro de 2003

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CARLOS HEITOR CONY

Poder pelo poder

RIO DE JANEIRO - Não gostei de saber que a popularidade de Lula caiu alguns pontos. Vejo com preocupação o desgaste de sua imagem -justamente a imagem que é inédita na vida nacional e deve ser preservada, pois se trata da única e saudável garantia da esperança que todos depositamos em seu governo.
Devo estar errado, como sempre, mas, observando os meses iniciais do PT no poder, verificamos a confusão e os conflitos internos do partido, inclusive uma tendência totalitária de cúpula tão nociva quanto a dos estados maiores que nos governaram durante o regime militar, e podemos concluir que somente o carisma popular de Lula poderá impedir um novo período de trevas em nossa vida social e econômica.
Deve ser ingenuidade minha, mas, contrariando os doutores da política, acredito na importância da personalidade individual no processo coletivo do crescimento de uma nação. Desconfio dos colegiados, das assembléias, dos consensos extraídos pelos fórceps das lideranças legítimas ou não. O PT, que se considera agora um gigante, um divisor entre o bem e o mal, continua sendo um partido pequeno e problemático, está inchado, como um rosto com caxumba, uma barriga com oclusão intestinal.
Seu tamanho real é o mesmo. A eleição de Lula foi um caso pessoal em nossa vida política, mal comparando, como o do Enéas, que teve votação estrondosa não pelo que ele pensa ou deseja, mas pelo tipo exótico que formou no imaginário de parte do eleitorado.
O que os adeptos de Enéas pensariam dele e de si mesmos se, de repente, o barbudo deputado se transformasse num Licurgo, num Solon, num Cícero, num Erasmo?
Com pólos contrários, a mesma suposição pode ser aplicada a Lula. Quem votou nele, queria ver um presidente diferente, fora do esquadro, novo e inovador, e não a continuação de um FHC, cuja preocupação maior era o poder pelo poder.


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