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ROBERTO MANGABEIRA UNGER
Plano sucessório
No dia seguinte ao segundo
turno do pleito municipal começa a sucessão presidencial. Projeto, base e agentes -essas as três exigências
para produzir reviravolta em 2006.
Reviravolta significa derrota das duas
coalizões partidárias dominantes -a
que governa agora e a que governava
antes- e portanto da orientação -a
mesma orientação- que ambas impuseram ao país. As dificuldades para
produzir a reviravolta são imensas.
Contrabalança-as, porém, circunstância que pode vir a ser decisiva se os adversários do rumo atual nos conduzirmos com audácia, sabedoria e desprendimento: o que está aí não é o que
o país quer.
O projeto, ao contrário do que se diz
todos os dias, já existe: esses anos de
frustração e de mentira revelaram
suas diretrizes. É preciso defini-las
com simplicidade em torno de alguns
grandes temas.
Deixar de organizar a economia brasileira como máquina para transferir
dinheiro de quem trabalha e produz
para quem empresta dinheiro ao Estado. O governo deve usar seus poderes
para enquadrar os interesses financeiros e para dar primazia aos interesses
do trabalho e da produção. E pode fazê-lo sem violentar o império do direito.
Resgatar mais da metade dos trabalhadores brasileiros da informalidade
e do subemprego, abolindo os encargos sobre a folha salarial e oferecendo
às empresas concessões tributárias e
regulatórias em troca de emprego e de
qualificação para trabalhador pobre.
Quer dizer: usar as forças de mercado
para valorizar o trabalho e o trabalhador.
Fixar como prioridade da política
social a construção de ensino público
de qualidade capaz de atrair a classe
média para a escola pública em proveito de todos. Ensino de século 21 que
nos salve do destino de vender ao
mundo trabalho desqualificado e barato.
Acabar com a causa principal da
corrupção na política, o regime existente de financiamento eleitoral. E
preparar a nação para o aprofundamento da democracia, baseado em
partidos fortes e em sociedade civil organizada.
Não representa esse projeto o paraíso sobre a terra; apenas o início daquilo pelo qual o país votou em vão em
2002. E não exige muito dinheiro; só o
que mais tem faltado aos que vem governando o Brasil: clareza e coragem.
A base partidária indispensável para
oferecer essa alternativa ao país nasce
sem ser percebida. É a convergência
entre o PDT e o PPS: base que tem em
integridade o que lhe falta em tamanho. Basta para lançar proposta e candidatura. Sensibilizado pouco a pouco
o eleitorado, outros apoios, políticos e
sociais, virão.
O candidato à Presidência ainda não
apareceu, mas aparecerá. Não se reconhece a dualidade de nosso presidencialismo plebiscitário. Em país ao
mesmo tempo tão grande e tão desigual quanto o Brasil, com empresas de
mídia mendigando do governo e com
eleitorado obrigado a intuir o que se
lhe não informa, é extraordinariamente difícil tornar mensagens e
mensageiros novos conhecidos em toda a parte. Quando se começa, porém,
a furar o bloqueio do desconhecimento, as muralhas caem com rapidez
igualmente surpreendente: a covardia
dos governantes contrasta com o arrojo dos eleitores -com sua abertura
de espírito e com sua sofreguidão para
encontrar saída. Que grande momento se aproxima!
Roberto Mangabeira Unger escreve às terças-feiras nesta coluna.
www.law.harvard.edu/unger
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