São Paulo, terça-feira, 26 de dezembro de 2006

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TENDÊNCIAS/DEBATES

Sanguessugas da honra

NEY SUASSUNA


Com as acusações que sofri, não saí mais das páginas dos principais jornais, o que me custou mais que o mandato. Custou-me a minha honra


DURANTE cerca de 140 dias, sofri um verdadeiro massacre por parte da imprensa nacional, acusado de fazer parte da quadrilha conhecida como "máfia das ambulâncias". Por ter tido um ex-assessor preso durante a Operação Sanguessuga da Polícia Federal, meu nome foi envolvido no escândalo e, mesmo depois de o próprio relator do processo, senador Jefferson Péres, declarar textualmente em seu relatório, mais precisamente na página 17, segundo parágrafo, que "não há nos autos uma única prova de efetivo envolvimento do senador Ney Suassuna na quadrilha apelidada de sanguessugas. Não há nem sequer indícios de que o senador houvesse se locupletado dos valores pagos a título de comissão a seu assessor Marcelo Cardoso", continuo sendo apontado pelos mais diversos setores da mídia como um parlamentar corrupto. Um sanguessuga do dinheiro público.
Tal parágrafo nem sequer foi levado em conta pela grande maioria dos repórteres que fazem a cobertura política. Para os jornalistas, o grande "mote" foi o trecho em que o relator pede a cassação do meu mandato pelo que chamou de "condescendência criminosa". Verdadeira situação kafkiana, pois, no meu modesto entendimento, equivale à condenação de um inocente pelo simples fato de não ter prendido o bandido durante um crime, sem que fosse policial ou juiz.
O relatório, apesar de estar eivado de incoerências, foi visto por grande parte da mídia nacional como "consistente", unicamente por pedir a cassação do meu mandato parlamentar, mesmo com a inexistência de provas do meu suposto envolvimento com a máfia das ambulâncias.
A questão é que o pedido atendia a um desejo expresso pela mídia nacional, que exigia a punição de parlamentares envolvidos em casos de corrupção e, naquele momento, sentia-se frustrada pela absolvição em massa dos chamados mensaleiros.
Na realidade, como disse o próprio Jefferson Péres, o que estava em julgamento não era eu, mas o sistema como um todo. Um sistema do qual todos nós fazemos parte.
Não é transformando esse ou aquele parlamentar em mártir, em exemplo, que vamos conseguir mudar esse anacronismo político e social em que vivemos. O que temos de modificar é a nossa própria cultura, a nossa maneira de resolver as coisas sempre com o famoso "jeitinho" brasileiro, atropelando a lei e a ordem.
A condenação de um inocente não trará a redenção política ao Brasil, mas, sim, agravará ainda mais o quadro de injustiças e desmandos.
Lamentavelmente, para a grande maioria dos brasileiros, a classe política eleita democraticamente pelo próprio povo é como um câncer que corrói o país. Mas ninguém se preocupa em fazer a sua parte. Procurar conhecer de perto o trabalho do parlamentar que elegeu e cobrar dele propostas e soluções para o país, e não se preocupar só em levar vantagem durante a eleição, leiloando o próprio voto, já seria um bom começo.
O denuncismo vazio também não contribui para o crescimento do nosso país. Acusar sem provas e aproveitar os generosos espaços cedidos pela mídia para tentar criar uma imagem positiva perante a opinião pública, sem se preocupar em saber se há ou não fundamento nas acusações, é, também, na minha visão, um exemplo de desrespeito à justiça e à democracia.
No meu caso, senti na pele as conseqüências desse tipo de atitude. Isso porque as acusações contra a minha pessoa se agravaram a partir da suposta declaração da senhora Maria da Penha Lino, ainda quando se encontrava presa pela Polícia Federal no Mato Grosso, de que eu faria parte do esquema. Uma declaração desmentida mais tarde pela própria Maria da Penha, mas que transformou a minha vida nos últimos meses num verdadeiro calvário.
O mais estranho nisso tudo é que tomei conhecimento do tal esquema a partir da imprensa, quando da divulgação da Operação Sanguessuga.
Até então jamais tinha ouvido falar em Planan, família Vedoin, Maria da Penha Lino ou qualquer outra pessoa envolvida na máfia. Os próprios indiciados confirmaram que nunca haviam estado comigo -nem sequer falado-, mas a minha palavra, naquele momento, não era considerada.
A partir de tais declarações, que tomei conhecimento apenas pela mídia -por ser o nome de maior destaque na política nacional entre os envolvidos, já que era líder do PMDB e do bloco da maioria no Senado Federal, além de ser visto como um dos principais interlocutores do governo Lula no Congresso Nacional-, não saí mais das páginas dos principais jornais do país, em charges, manchetes e fotos, o que me custou mais que o mandato. Custou-me a honra. E isso não há meios de reparar.

NEY SUASSUNA é senador pela Paraíba e líder do PMDB no Senado.


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