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Voto e cassação
Na falta de uma reforma política ampla, punição à infidelidade partidária suscita dúvidas e questionamentos
DEPOIS DE longo e sinuoso percurso, foi oficializado pela Câmara o
primeiro caso de perda
de mandato de um deputado federal por infidelidade partidária.
Trata-se do parlamentar paraibano Walter Britto -que, eleito
pelo PFL (hoje DEM), logo passou a integrar o PRB. Dito de outra forma, candidatara-se num
partido de oposição, para em seguida aderir à base governista.
Não mais que um exemplo, entre incontáveis, da crônica indisciplina partidária que caracteriza a vida política brasileira.
Sem dúvida, a cassação do deputado Britto vem no mínimo
inibir um tipo de comportamento que, até agora, aparecia menos
como um escândalo -coisa que
muitas vezes é- e mais como
parte das alegres e tradicionais
rotinas que marcam o início de
cada legislatura.
Todavia, persistem intocados
os fundamentos do problema.
Foi apenas em razão de um questionável entendimento judicial
-manifestado pelo STF e pelo
TSE- que se deu a cassação. A
saber, a tese de que o mandato de
um parlamentar não lhe pertence, mas sim ao partido pelo qual
ele foi eleito.
É segundo esse princípio que,
agora, reverte ao DEM a cadeira
perdida com a transmigração do
deputado. Walter Britto obteve
12.934 votos. Cede lugar ao demista Major Fábio, sufragado
por 4.061 eleitores.
Nada mais difícil, na verdade,
do que imaginar qual a verdadeira vontade do eleitor numa disputa proporcional.
Pode ocorrer que determinado
candidato, por obra de seu prestígio pessoal, veja-se eleito com
centenas de milhares de votos,
apesar de pertencer a uma legenda insignificante.
Supondo-se que mude de partido, parece mais lógico considerar, nesse caso, que o mandato é
patrimônio político seu, e não do
agrupamento a que pertencia.
De resto, as atitudes e compromissos dos partidos brasileiros
costumam ser tão voláteis quando a dos políticos tomados individualmente. Agremiações inteiras, apresentando-se diante do
eleitorado como oposicionistas,
subitamente aderem ao governo.
Uma efetiva vinculação entre
candidatos e partidos depende
não apenas do aprimoramento
da cultura política, mas de mudanças no mecanismo eleitoral e
parlamentar que, como se sabe,
vêm sendo discutidas, adiadas,
esquecidas e retomadas num circuito do qual não se vislumbra
saída concreta a curto prazo.
Em decorrência das hesitações
e dos adiamentos na realização
de uma ampla reforma política, o
ponto específico de como coibir
a infidelidade partidária acabou
definido por decisões judiciais.
As ambigüidades e dúvidas que
cada caso particular de cassação
de mandato tenderá a suscitar,
mantendo-se os critérios aplicados agora, não deixam de ser um
sinal das dificuldades inerentes
ao debate -se é que existem, no
meio político, forças dispostas a
empreendê-lo de fato.
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