|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
TENDÊNCIAS/DEBATES
Deve ser aprovado o projeto de lei que descriminaliza a ortotanásia?
NÃO
O rumo certo do debate
MIGUEL MARTINI
LEGISLAR sobre a ortotanásia
-que é o decorrer natural do
processo de morte, sem intervenção de tratamento artificial que
prolongue a vida vegetativa do paciente- pode abrir brechas para a
aprovação da eutanásia no país. Por
essa razão, somos contra uma lei a
respeito desse tema. Consideramos
melhor disciplinar sobre os procedimentos assegurados ao paciente.
Por isso, preocupado com o tema,
apresentamos o projeto de lei 6.544/
09, que dispõe sobre os cuidados devidos a pacientes que se encontram
em fase terminal de enfermidade.
A vida humana deve receber todo
cuidado e toda atenção, desde a concepção até completar seu curso natural, pois todo ser humano tem direito
de nascer, crescer e chegar ao fim de
sua vida com dignidade.
Sabemos que drogas e máquinas de
última geração são capazes de manter
um cidadão "vivo" por muito tempo,
às vezes, por anos, sem nenhuma
perspectiva concreta de recuperação.
No entanto, a ética, o bom senso e a
caridade determinam ser desnecessário prolongar a vida artificialmente
se tal procedimento não levar à esperança de reversão do quadro clínico
ou da recuperação do paciente em casos terminais.
Um exemplo claro do que estamos
falando -e que o mundo inteiro tomou conhecimento- ocorreu com o
papa João Paulo 2º. Diante de sua enfermidade, mantê-lo vivo artificialmente, sobrevivendo por aparelhos,
em nada melhoraria seu quadro, além
de prolongar seu sofrimento e o de todos que o amavam.
É importante ressaltar que uma decisão da prática da ortotanásia deve
sempre ser tomada com aquiescência
do paciente e dos seus familiares e/ou
responsáveis, conforme aconteceu
com o papa João Paulo 2º.
À luz do projeto de lei que queremos aprovar, é mais ético e moral que
se procure aliviar a dor do paciente e
que se lhe ofereça qualidade de vida
junto a seus familiares, evitando intervenções agressivas que não trazem
esperança de vida, e sim mais sofrimento e desgaste para o paciente e
para a família.
Urge alertar a classe médica para
um sério discernimento sobre as condições do paciente e dos meios terapêuticos à disposição, pois a renúncia
a meios extraordinários ou desproporcionados não equivale ao suicídio
ou à eutanásia. O projeto de lei
6.544/09 distingue-se em tudo e por
tudo da eutanásia, que não é aceitável.
O médico deve esclarecer ao paciente
em fase terminal de enfermidade, à
sua família e ao seu representante legal as modalidades terapêuticas, adequadas e proporcionais para o tratamento do seu caso específico.
O papa Pio 12, em 1957, afirmava
que é lícito suprimir a dor por meio de
narcóticos, mesmo com a consequência de limitar a consciência e abreviar
a vida, "se não existem outros meios e
se, naquelas circunstâncias, isso em
nada impede o cumprimento de outros deveres religiosos e morais".
No entanto, também deve ser considerado que a Igreja Católica nos diz,
no Código Canônico (nº 65): "Não se
deve privar o paciente da consciência
de si mesmo, sem motivo grave.
Quando se aproxima a morte, as pessoas devem estar em condições de poder satisfazer as suas obrigações morais e familiares e devem sobretudo
poder preparar-se com plena consciência para o encontro definitivo
com Deus".
Os dois princípios devem ser considerados antes de qualquer decisão.
Consideramos, ainda, fundamental
que haja mecanismos que permitam,
com segurança, detectar casos semelhantes a esses e que os pacientes deles se beneficiem, sem, no entanto,
abrir-se à possibilidade da prática da
eutanásia.
Acreditamos que, com a aprovação
do projeto de lei de nossa autoria, daremos os balizadores necessários para que a comissão de ética multidisciplinar em cada unidade hospitalar
possa intervir com segurança nesses
casos.
O assunto certamente levará a profundos debates na Comissão de Seguridade Social e Família, onde tramitam as duas proposições.
Assim, daremos uma resposta à sociedade atendendo aos pressupostos
da ética médica, da dignidade humana e do profundo respeito aos direitos
do paciente.
MIGUEL MARTINI , historiador, é deputado federal pelo
PHS-MG, membro da Renovação Carismática Católica, da
bancada católica no Congresso e líder do seu partido.
Os artigos publicados com assinatura não traduzem a opinião do jornal. Sua publicação obedece ao propósito de estimular o debate dos problemas brasileiros e mundiais e de refletir as diversas tendências do pensamento contemporâneo. debates@uol.com.br
Texto Anterior: TENDÊNCIAS/DEBATES Carlos Vital Lima: O direito de viver e de morrer Próximo Texto: Painel do Leitor Índice
|