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Corrupção
à solta
OTAVIO FRIAS FILHO
Helmut Kohl, o artífice da reunificação alemã, está sob suspeita de corrupção. Como em tantos outros escândalos que periodicamente vêm à
tona no mundo desenvolvido -o
próprio Clinton é objeto de um deles-, sempre se trata de financiamento eleitoral em troca de vantagens futuras, caso o candidato se eleja.
Seja no Primeiro ou no Terceiro
Mundo, esse é cada vez mais o nó central da corrupção política. Numa atitude "profissional", as grandes empresas contribuem em favor não de
uma candidatura, como às vezes se
imagina, mas de todas, na proporção
do capital eleitoral que cada uma vai
acumulando nas pesquisas.
Ao agir dessa maneira, a empresa
não só capta compromissos de vantagens futuras, se o candidato chegar lá,
mas faz um seguro contra eventuais
retaliações. Na outra ponta, a do político profissional, não há candidato,
por bem-intencionado ou esquerdista
que seja, apto a prescindir de (muito)
dinheiro para vencer.
Entre o capital e o candidato está o
maquinismo perverso da democracia
contemporânea, que transformou a
política num espetáculo midiático
que, além de custar caro, aplaina qualquer dissenso programático ou opção
verdadeira, fazendo-os convergir para
uma média estatístico-publicitária:
Bush ou Gore, tanto faz.
O paradoxo, então, é que o combustível que alimenta a grande corrupção
é o mesmo a sustentar o grande circo
democrático, onde nada de importante, aliás, está realmente em jogo, daí a
sensação de estabilidade política em
porções crescentes do planeta. Como
o problema é estrutural, leis podem
contê-lo, mas não extirpá-lo.
Conforme a política se esvazia no
que lhe é essencial -a controvérsia de
idéias-, à medida que ela se converte
em mera "administração das coisas",
é natural que a lacuna seja ocupada
por um conteúdo moral, que encontra
grande ressonância no eleitorado e
que desperta, por isso mesmo, uma
atenção prioritária na mídia.
É difícil dizer se a corrupção "nunca
foi maior do que hoje". A famigerada
dissolução dos costumes, que foi um
bem em muitos sentidos, terá sido um
mal nessa matéria, ao solapar escrúpulos arraigados num ambiente anterior, religioso e repressivo. É provável
que a corrupção seja mais desenvolta;
seu volume por certo é maior.
Até pouco tempo atrás, porém, as
instâncias de controle público -em
especial promotoria e imprensa, as
mesmas que se pretende restringir
agora com a Lei da Mordaça- agiam
com muito menos autonomia, quando agiam. Parte da sensação geral de
corrupção generalizada decorre de ela
estar saindo das sombras.
Claro que tem havido casos de irresponsabilidade na divulgação de denúncias e que eles devem ser coibidos.
Mas é graças a essa vigilância montante que o problema começa a ser confrontado. Sua base, entretanto, está no
cerne da democracia pós-moderna,
de onde não vai ser fácil arrancá-la
sem que o resto do edifício venha
abaixo.
Otavio Frias Filho escreve às quintas-feiras nesta coluna.
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