São Paulo, sábado, 27 de janeiro de 2007

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TENDÊNCIAS/DEBATES

O PAC (Programa de Aceleração do Crescimento) representa uma inovação na política econômica?

SIM

Um PACto pelo Brasil

ANTONIO CORRÊA DE LACERDA

O PAC representa mudança em pelo menos três aspectos: na definição de metas de investimentos, na fixação do que compete ao Estado no processo e na reintrodução na gestão por objetivos e projetos e métodos de acompanhamento da sua execução. Pode vir a ser o marco de uma mudança qualitativa da política econômica vigente. Mas isso vai depender de algumas condicionantes.
Definir metas de investimentos e prioridades é questão relevante, mas não suficiente. Há uma interessante questão teórica econômica de fundo envolvida: a poupança gera o investimento -visão neoclássica, predominante na corrente principal ("mainstream")- ou o investimento gera crescimento, sendo a poupança decorrência -visão keynesiana? No primeiro caso, a poupança é um pré-requisito, no segundo, é resultado.
Estou entre os que se alinham à segunda hipótese. No Brasil, claramente, o problema não é falta de poupança, mas de criar as condições para que a expectativa de crescimento fomente as decisões de investimento.
É preciso carrear parte dos recursos hoje esterilizados no mercado financeiro para os investimentos produtivos. O desafio é aumentar a taxa de formação bruta de capital fixo, atualmente em cerca de 21% do PIB, para, pelo menos, 25%, nível mínimo para suportar um crescimento econômico continuado de 5% ao ano.
Não se trata de uma questão conjuntural, mas estrutural. O Brasil se tornou uma das dez maiores economias do mundo no século 20, na industrialização tardia, calcado no nacional-desenvolvimentismo. O modelo de substituição de importações e o trinômio Estado-capital privado nacional-capital estrangeiro suportou o crescimento acelerado médio de 7% ao ano no período 1946-1979.
Após a "década perdida" dos anos 80, o Brasil aderiu ao neoliberalismo nos anos 90. Perdeu-se aí a visão estratégica de longo prazo, e o país inviabilizou-se, diante da vulnerabilidade externa, tornando-se refém dos juros elevados. Foi a "construção interrompida", na feliz definição de Celso Furtado. Nos últimos 26 anos, o crescimento tem se limitado à média de apenas 2,5% ao ano.
O PAC, como todo plano, só se materializará na sua execução. Seu sucesso dependerá basicamente de três principais condicionantes.
A primeira é que haja o comprometimento de todas as áreas governamentais envolvidas na sua implementação. Isso parece óbvio, mas tem prevalecido uma visão excessivamente departamentalizada da política econômica, o que compromete o alcance dos objetivos gerais.
A segunda é o comprometimento dos demais Poderes e o engajamento dos atores sociais. É preciso um verdadeiro pacto que leve em conta o interesse da nação, acima de objetivos de curto prazo, visão partidária, vaidades pessoais e interesses setoriais.
A terceira é da coerência e consistência do conjunto da política macroeconômica. As políticas fiscal, monetária e cambial estão claramente na contramão dessa visão novo-desenvolvimentista sugerida no PAC.
É preciso não confundir continuidade com continuísmo e assumir que é preciso aperfeiçoá-la. A conseqüência do imobilismo será inviabilizar o desenvolvimento. O câmbio valorizado, para citar a principal distorção, é um subsídio às importações e um desestímulo às exportações, à geração de valor agregado local, aos investimentos, renda e emprego.
Houve avanços nos últimos anos, o controle da inflação, a redução substancial da vulnerabilidade externa e das "medidas de exceção". As precondições estão dadas. Falta romper paradigmas, superar dogmas e recriar um caminho próprio. O ponto de partida dos fundamentos macroeconômicos, externos e domésticos, é o melhor das últimas três décadas. É preciso perder o medo de crescer e tomar as iniciativas para tanto.


ANTONIO CORRÊA DE LACERDA, doutor pelo Instituto de Economia da Unicamp, é professor do Departamento de Economia da PUC-SP e autor, entre outros livros, de "Globalização e Investimento Estrangeiro no Brasil".

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